A Audio, tradicional casa de shows da capital paulista, receberá nesta sexta-feira (5) a cantora Jaloo. Ela celebra, nesta apresentação, três fases musicais de sua carreira e promete repassar o repertório dos discos que a estabeleceram como uma grande e criativa artista.
“Se eu deixasse minha música na mão de outros não ficaria tão feliz”, explica ela, em entrevista ao Papelpop semanas atrás, por telefone. “Não é um lado controlador se manifestando, mas sei que gosto de cuidar de cada detalhe”.
Cantora, compositora e produtora, ela conta com a presença de convidados e se apresenta ao lado de uma banda formada por George Costa (percussão, bateria e programação), Bia Chantal (guitarra e sintetizador) e Michele Cordeiro (guitarra), além de outras quatro bailarinas.
“‘Mau’, meu disco mais recente, é um disco íntimo. Pensando em expandir esse campo, teremos troca de figurino, baile e luz especiais para cada momento porque a ideia é revisitar tudo com carinho e fazer um show inesquecível”, adianta.
Na quinta-feira (4), a cantora estreou dois remixes de faixas presentes em seu álbum: “Mau”, com CyberKills, e “Quero te ver gozar”, com o DJ e produtor Mu540. Ouça:
No papo que você lê a seguir, ela faz um retrospecto da própria trajetória, fala sobre referências e analisa tendências como TikTok e Chat GPT. Para a artista, que se esquiva das cobranças, o bom mesmo é ser livre, sobretudo, ao criar.
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Papelpop – Logo mais o seu primeiro álbum completa dez anos. Olhando para trás, quais observações faz?
Jaloo – Faço muitas. Uma das coisas que mais penso em relação aos meus próprios discos é o quanto o ser humano muda. A gente sempre pensa que é incapaz de se transformar, mas quando o tempo passa e você consegue olhar para si mesma, dá pra ver que deixamos de ser tantas coisas.
PP – Gosta de pensar que, ao compor cada trabalho, assume uma persona diferente?
J – Sim. Existem várias personas que habitam em mim e é divertido vê-las saírem para passear [risos]. No primeiro disco, por exemplo, houve um movimento muito natural de expor isso, mas um pouco depois da estreia percebi que celebrava algo muito importante e que eu negava: a criança que habitava aqui dentro e que já fez muito mais parte de mim, mas acabou sendo engolida pelo adulto.
PP – Você diz isso com muita honestidade. ‘Mau’ chegou como uma celebração ao feminino de sua identidade. Como foi trilhar esse caminho em que intimidade é algo tão vivo?
J – Amorosamente, este é o primeiro álbum que faço solteira. Estou vivendo um momento muito diferente da minha vida e estou gostando disso. Não é que eu sinta saudade do que eu tinha antes, mas assumo e seguro o que eu quero no presente. Como eu me apaixonava, e isso era recíproco, havia muita paixão e amor envolvidos. Muitas partes de mim, ao compor, ficavam escanteadas. Desta vez, construí um trabalho sincero e que me dá a oportunidade de ser inteira. Por isso eu talvez veja ‘Mau’ como o meu disco mais verdadeiro.
PP – Sua amiga e colaboradora Gaby Amarantos venceu um Grammy Latino no ano passado e a fusão de eletrônico e música brasileira parece, finalmente, romper a bolha do alternativo. Pensando o seu trabalho com esses ritmos e subgêneros, sente que as pessoas estão mais atentas?
J – Que pergunta provocadora. Eu poderia dizer que sim, mas não sei se acredito realmente nisso. A música nunca deixou de ser assim, mas sinto que estou enxergando mais e querendo jogar o jogo da indústria por diversão. A música está mais pasteurizada, dura menos, ficou mais palatável. Aí vejo que fiz esse disco já pensando nos próximos projetos, no que eu faria adiante, porque a minha cabeça já está contaminada com a ideia de que as pessoas vão ouvir, até vão assimilar, mas no instante seguinte vão aparecer pedindo mais. Fiquei quatro anos trabalhando o meu primeiro disco, rodando por aí. Entre o segundo e o terceiro tive outros projetos, mergulhei no disco da Gaby, tive a banda Os Amantes, um projeto em que quis sair de mim e pude sair ao criar um personagem que assumisse a banda. Mas o intervalo também foi menor entre cada uma dessas obras. Estou doida pra fazer mais, mas não consigo dizer se isso é bom ou ruim. O que sei é que gosto de me desafiar. Tem gente fazendo muita eletrônica bem legal, com uma veia mais pop, mas não sei se a gente tem tido tanta atenção. Isso é uma escolha, talveé diverz precisamos observar o espírito do tempo.
PP – Artisticamente, você sempre foi muito inventiva — algo que o público aprecia ao ponto de ter instituído esse adjetivo como uma marca do seu trabalho. Se sente cobrada?
J – Me sinto, mas atualmente me sinto mais por mim mesma [risos].
PP – O que é pior, sentir-se cobrada por si mesma ou pelos outros?
J – Acho que pelo público, se você já se colocou em um lugar habitável de artista, isso é difícil. Sobretudo no começo. Eu quase enlouquecia com tanta informação. Mas, agora, estou mais tranquila. Se me cobram, dou uma analisada sobre o que aquilo significa como um todo. Antes pensava em cada indivíduo, levava em consideração cada palavra dita. Isso me dava a sensação de preocupação, às vezes se tornava quase uma obsessão temática. Hoje, vejo os fãs com carinho, mas suas palavras de uma forma relativamente mecânica [risos]. Essa análise do todo me ajudou a inverter cobranças.
PP – Muito antes de Billie Eilish que ficou conhecida por gravar em casa, no quarto, você já fazia isso. Pode-se dizer que o fazer musical ficou mais democrático ou isso também é mais revoltoso, uma forma que se encontrou pra driblar as limitações da indústria?
J – Acho que um pouco das duas coisas. A música de periferia, por exemplo, me inspira muito. Adoro funk, techno brega, brega funk. É divertido o quanto esses sentimentos, vontades e desejos são tão intensos e dão origem a uma música que não está nos moldes clássicos, mas pode fazer sucesso e ser maravilhosa. Parto muito desse lugar do autodidatismo. Instalei a pia do meu banheiro, para que você tenha uma ideia. Adoro fazer de tudo: cozinho, faço jardinagem das minhas inúmeras plantas, limpo minha casa e me vejo nesse lugar do cuidado, do que precisa ser feito. Isso me traz alegria. Se eu deixasse minha música na mão de outros não ficaria tão feliz. Não é um lado controlador em sua plena manifestação, mas sei que gosto de cuidar de cada detalhe. Isso não é uma coisa muito entendida por sua maioria, esbarro com pessoas que acham que minhas composições e produções passaram pelas mãos de outros… Mas estou fazendo coisinhas pouco a pouco para que essa realidade mude e todos enxerguem isso. Criei uma série abrindo faixa a faixa de cada disco no TikTok e estou simplesmente postando. Nem divulgo nas outras redes, os seguidores estão crescendo exponencialmente. Temos muitas ferramentas democráticas ao nosso dispor e precisamos usar isso. Eu tinha medo de me verem, de me julgarem, é um público que chega pelo algoritmo, mas muitos produtores musicais se atraíram pela conta… Realmente, os nichos criaram algo legal. Não tenham medo, saiam postando lá que vale a pena [risos].
PP – Você falava de encontros e me interessa muito a sua relação com o Phonk. Essa referência chegou até você de que forma?
J – Começou quando fui visitar uma amiga, queria fofocar e falar da vida, mas também mostrar algumas músicas que já tinha pro disco. Em certo momento, ela me contou sobre os filhos de amigos dela com quem foi para a praia e não paravam de ouvir um som específico. Eu comecei a me encantar com a história inteira, depois percebi que eu já tinha ouvido aquilo, porque várias dessas músicas já tinham sido hit de TikTok. Me marcou e eu, que já terminava o disco, quis experimentar algo que conversasse tanto com o aqui e o agora. Mergulhei de cabeça, estudei produção de phonk, inclusive, descobri que há uma cena de produtores brasileiros que mistura esse gênero com o funk nacional… Era o que faltava e, nessa mesma levada, me falaram sobre o chat GPT…
PP – … Já tinha usado antes?
J – Nunca, foi específico pra essa música. Queria que ela fosse mais à frente de seu tempo possível. Na verdade, fiz isso muito contrariada, convencida por um amigo. Escrevi um resumo do que queria, tava com essa ideia de explorar o conceito de ‘le petit mort’, isto é, morrer um pouquinho toda vez que se goza. O chat me deu uma letra inteira, rica em palavras. Fiquei assustada, havia muitos textos legais. Remontei aquilo, reconheço que 30% da música é do chat, mas a ordem e melodia são todas minhas. A tristeza faltava, era uma parte de mim que não consigo largar. Quando percebi, realmente havia algo valioso.
PP – Você vai se apresentar na Audio, em São Paulo, repassando seus três discos. Normalmente, tem o hábito de revisitar suas próprias produções?
J – Sim. Aliás, o que me preocupava mais para esse espetáculo era “Ft. (Pt.1)”, por causa das participações. Levantei duas, por enquanto, e há uma terceira com quem estou conversando… Esse um disco feito à base de colaborações, era muito importante ter essas pessoas nesse ato do show. O primeiro disco, à sua vez, tem uma melancolia nostálgica. Vamos executar, “Sky”, uma canção que acho incrível, modéstia à parte, mas nunca antes tinha tocado ao vivo. Não me pergunte o motivo, não sei. Agora, chegou a hora de dar todo um espaço para que ela brilhe. O terceiro ato me parece muito empolgante. Estamos descobrindo música por música, como executar, quando uma faixa realmente ‘acontece’. Tá bem legal. Tem sido divertido e não tenho do que reclamar. Gosto do palco, não tenho um ritual para acabar com o nervosismo, não tenho lembranças de tensão. É o lugar onde me encontro, onde me desligo.
PP – Considera-se ansiosa?
J – Sim, a minha cabeça está o tempo todo conectada, mas no palco eu consigo atingir esse espaço de paz. Estou me libertando.
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Os ingressos para o show de Jaloo, em São Paulo, estão disponíveis neste link. Para ouvir mais da artista, acesse seu tocador de música favorito.
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