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Bruno Berle fala sobre “No Reino Dos Afetos II”, segundo disco da carreira que virá em 2024

Era uma manhã de início de verão, quando Papelpop pode falar com Bruno Berle nas primeiras horas de um dia. Ele havia acabado de lançar “Tirolirole”, faixa épica-melódica que marca os passos iniciais do artista rumo ao segundo álbum da carreira — que será lançado pela tríade Coala Records, aqui no Brasil; Far Out Recordings, na Europa; e Psychic Hotline, nos Estados Unidos.

Acompanhado de um café coado e um olhar atento, o cantor alagoano, radicado em São Paulo, abre os primeiros detalhes de “No Reino Dos Afetos II”, o segundo compilado de canções ditas como lo-fi no primeiro momento, mas que, agora, tomam uma roupagem mais robusta e surgem com mais corpo, forma e mesma alma que encantou os ouvidos, quando emergiu à cena experimental em meados de 2022.

Berle revela o tamanho do projeto; conta que o disco foi pensado, inicialmente, para ser produzido pela amiga Ana Frango Elétrico (dona do poderoso “Me Chama de Gato Que Eu Sou Sua“); e revela a equação final que uniu os caminhos dele ao de Batata Boy, produtor talentoso e parceiro de longa data, para o estúdio — seja na rua ou em casa.

Papelpop – Seu último single foi “Tirolirole”. Feliz como essa música?

Bruno Berle – Estou quase delirando. Porque, para mim, a coisa mais forte no meu trabalho é realizar. Além de eu achar que eu tenho um dom para isso, sinto um tesão em colocar uma coisa [música] pra fora, de envolver tanta gente. Nesse trabalho, envolvi três selos, que é o Coala Records, aqui no Brasil, a Far Out Recordings e a Psychic Hotline. Foi muito trabalho para envolver todo mundo, e a música está pronta há muitos anos, desde 2019. Tenho muito coisa gravada. Feliz também do público receber algo novo, é incrível, mas a minha realização pessoal é algo gritante, também.

PP – E trabalhar com estes três selos deve ser difícil, imagino eu. Eles opinam criativamente no seu trabalho?

BB – É só estratégia. Coala Music me deu toda liberdade do mundo para eu fazer o álbum do jeito que eu queria. Acho até que eles esperavam um outro álbum, como eu vinha dizendo em umas entrevistas: um álbum mais eletrônico, com menos violão. Mas ao mesmo tempo, acho que eles gostaram de ter continuado a história. Foi bom para eles, também.

PP – Eu senti nela uma paz, aquele marasmo positivo, quando você se vê tomando um sol, feliz com os dias que viveu. Qual era sua intenção ao fazer essa música, que abre caminho pro álbum?

BB – Essa é uma música de um compositor pernambucano que me toca muito, que é o Phylipe Nunes Araújo, amigo, artista de 25 anos. Ouvi essa música em 2019, durante um festival de arte que nos encontramos. Ela sempre me tocou num lugar tão puro, ao mesmo tempo de um amor épico e seguro. A letra dela tem muito do que queria transmitir no primeiro álbum — grande parte dela, inclusive, foi gravada durante o processo do disco primeiro. Tinha tudo para estar no primeiro, mas essas coisas acontecem. Acho que combinava, inclusive. Ela tem uma coisa da autoestima do amor, de abrir as portas e as janelas do coração e preparar a casa para receber um grande amor.

(Foto: Marina Zabenzi/Divulgação)

PP – Aqui o amor é romântico ou não romântico?

BB – É aberto. Sempre é aberto. Pelo menos, as músicas do primeiro e do segundo álbum são abertos. Mas no meu caso e desse novo single, e dentro de um contexto do segundo álbum, são sobre amor romântico.

PP – Esse single foi produzido com seu amigo Batata Boy, assim como seu primeiro disco. Como é para você produzir com pessoas como ele, que são seus amigos na vida fora do estúdio? É mais fácil?

BB – Total, é mais fácil. Sempre foi um desejo meu produzir com todo mundo, mas tem sido legal conversar com outros artistas. O Batata [Boy] tá comigo também neste segundo álbum que vem aí, e também em coisas que estamos fazendo por agora, para o álbum dele. Eu e ele temos uma simbiose tão grande, que tem uma história boa. A ideia é que Ana Frango Elétrico produzisse o meu segundo álbum. Tava tudo certo, quando fomos pro estúdio produzir, esse single foi uma das primeiras a gravar e, logo na primeira semana, Ana percebeu, com muita leveza, que talvez não fosse o momento dela me produzir e que era, realmente, para eu e Batata produzirmos. Eu liguei pra ela depois, e fiquei: ‘Amiga, não sei se você está se sentindo bem’. E ela falou: ‘Amigo, está tudo ótimo. É o momento de vocês mesmo, tem que fazer com seu parceiro de tempos’. Nos libertou, com todo o carinho e respeito por nosso trabalho. Tenho um carinho e gratidão enorme por ela, desde 2020, quando ela entrou no meu caminho e agregou muito.

PP – Inclusive, você tem ouvido o novo álbum da Ana? Fez barulho quando foi lançado, ano passado.

BB – Venho ouvindo esse álbum há um tempo, ela vem me mostrando em vários sessões. Eu ouvi a primeira vez em janeiro de 2022. Tinham algumas coisas diferentes, mas as bases já estavam todas ali. É incrível, é o melhor álbum do ano, sem sombra de dúvidas. Acho que é um álbum que tem referências lindas, mas é moderno no jeito que soa. É mais romântico, é muito bom ver Ana cantando amor romântico. Ela já cantou sobre tantas outras coisas, foi legal ela libertar esse lugar.

PP – Voltando a falar do seu próximo projeto, o “Reino dos Afetos” eu arrisco a dizer que é um disco experimental de música eletrônica que passa por vários ritmos. O seu próximo disco vai seguir esse caminho, por ter sido feito no mesmo período que o primeiro, ou vamos te ouvir em novos lugares?

BB – ‘No Reino Dos Afetos’ é um álbum diverso. Ele tem uma parte bem orgânica, que é a primeira música com violão; a segunda, já tem pegadas eletrônicas; e depois volta violão. É muito variado, e é a marca dele por ser dinâmico e “mal gravado”. E isso marcou as pessoas. Já o segundo álbum, é bem gravado e com MUITO dessa dinâmica. Tem músicas com muitos beats; músicas mais orgânicas, como é esse meu single, que é a última do álbum. O segundo álbum, ‘No Reino Dos Afetos II’, é a continuação por duas razões principais: a primeira, porque são canções que se perderam e não entraram no primeiro álbum, foram gravadas antes e receberam um novo toque agora; e o segundo ponto fundamental é que ele é diverso, como o primeiro, e é uma evolução de arranjo, pensamento e estrutura do disco de estreia, com a mistura de gravar em diferentes lugares (em casa, no estúdio).

PP – E você pode contar algo mais para nós? Vai realmente se chamar “No Reino dos Afetos II”? Quem vai estar com você? Quantas faixas?

BB – Posso te contar um pouco… [risos]. Te digo que vai chamar, sim, “No Reino dos Afetos II”, terão dez faixas e é produção minha e de Batata Boy, principalmente dele. Com mais músicos desta vez, mas eu ainda toco a maioria dos instrumentos. Tem participação de uma cantora alagoana chamada Marina Limegi, tem João Menezes, que estava comigo no primeiro. Vai sair pelo três selos que eu trabalho: a Coala Records, a Far Out Recordings e Psychic Hotline, que lançam o Tim Bernardes e o Amaro Freitas nos Estados Unidos e estão começando a ter artistas brasileiros.

PP – Aproveitando a deixa, você faz muitos shows fora daqui, e lança produções pela Far Out Recordings. Fez até uma turnê pela Europa em dezembro passado. Acha que o público de fora, seja brasileiros ou não, recebem seu som de peito mais aberto que os daqui? Ou você não vê diferenças?

BB – Eu vejo diferenças, sempre têm. Mas acho que o público de fora é tão receptivo e amável quanto o daqui para minha música. Meu primeiro álbum foi bem recebido tanto aqui quanto lá fora, tinha essa parada de ser lo-fi, mal gravado e tudo, mas chegou bem. Sinto que, fazendo shows lá fora, mesmo sendo só eu, senti que todo mundo foi caloroso e afetuoso.

PP – Aproveitando que você falou sobre som, há um meses, eu vi você tuitando um tanto quanto bravo, parecia, sobre suas músicas não serem tropicalistas e, para quem não souber sobre seu som, te perguntar ou pesquisar sobre. Como você define, hoje em dia?

BB – Eu faço música brasileira, diversa demais, que traz muitas referências mas principalmente nordestinas. Acho que distante da Bahia, de certa forma. Mais pra cima, digamos assim. Estive na Bahia muitas vezes, amo lá e amo os artistas. Amo Gil, Caetano, Jadsa, gosto. Mas acho que minha música vai para outro lugar: vai de encontro com as músicas dos cantadores de Alagoas e Pernambuco. Sinto que o tempo forte não é meu lugar, o meu lugar é a síncope. O coco de roda é sincopado, não trabalha com tempo forte. É uma loucura. O martelo alagoana tem tempo forte, mas é doidera. O coco de roda, o galope beira-mar, ciranda, o maracatu, o frevo trabalham com ritmos que tem mais a ver com a África, que tem tudo baseado na síncope.  Tento trabalhar tudo isso. Amo todos os outros ritmos, gosto deles. Mas pra mim, quero experimentar outras coisas. E minha música pede isso de mim. Sempre pediu.

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