A fixação do público brasileiro pela mexicana Thalia caminha rumo à sua terceira década. É verdade que foram as novelas as responsáveis por popularizar seu trabalho por aqui, sobretudo a chamada trilogia das Marias. No entanto, sua influência musical foi o que manteve esse império vivo e ativo, conquistando gerações a partir de uma mistura de gêneros que vai do pop ao tradicional huapango.
Com tamanha diversidade e vendo seus hits tomarem conta das rádios de forma sucessiva, seria natural que houvesse, hoje, uma curiosidade a respeito das canções que despertaram seu afeto e atenção antes de que seu nome se convertesse em sinônimo de popstar.
Em “Thalia’s Mixtape”, projeto multimídia lançado na última sexta-feira (28) pelo Paramount+, é possível não apenas revisitar memórias da artista, mas igualmente conhecer as ditas faixas e seu contexto de criação.
Editado ainda em formato de álbum com 11 canções, a série de três episódios une a artista a seus ídolos para uma mistura de histórias da carreira, feats e esquetes de ficção.
Entre os convidados, estão Charly Alberti, guitarrista remanescente do grupo argentino Soda Stereo; e Andrea Echeverry e Hector Buitrago, que formam o duo colombiano Aterciopelados, um dos mais icônicos da América Latina.
Jovens vozes como Ben Carrillo, Bruses e Kenia OS também a ajudam a dar fôlego à narrativa.
Com os pés no presente e o olhar no passado, Thalia oferece um vislumbre de intimidade e vulnerabilidade a seus gostos mais pessoais, formados em um tempo em que a forma de consumir música era outra.
Em bate-papo com o Papelpop, a cantora discute a influência que recebeu de seus pares antes de se tornar uma estrela, analisa o próprio legado e resgata lembranças que a tornam, a despeito do que se imagina, uma pessoa comum, apaixonada pelos sons.
Papelpop – O título do seu novo projeto me parece muito curioso, porque diz muito com apenas uma só palavra.
Thalia – Absolutamente! A palavra “mixtape” traz de volta a forma com que se ouvia música no passado. Ali, estão as canções que me influenciaram e me deram a coragem necessária para que eu pudesse me expressar. Basicamente, a curadoria que faço nesse disco é uma atualização desse processo que hoje vejo muito presente nas playlists. Quer dizer, as mixtapes eram compilações que você fazia em fitas cassetes e pra mim isso era sinônimo de rock em espanhol. Esses roqueiros que homenageio agora me deram a força necessária pra ser quem sou.
Na série, é interessante como eles descrevem o que acontecia na época, na sociedade, e também internamente, em todo esse movimento que se estrutura a fim de inspirar uma juventude a se libertar, dizer e fazer as coisas com o coração. As mixtapes simbolizam momentos da nossa vida, da adolescência, da juventude. Uma fase em que você entendia a dimensão de ter força para sair adiante, emocionalmente falando.
PP – O fato de o rock em espanhol ser predominante entre as suas mixtapes adquire um significado bastante específico porque, ao expor isso, você trata de vulnerabilidades. Me emocionei te ouvindo cantar e falar de “Persiana Americana”, do Soda Stereo. É uma das minhas canções preferidas!
T – Ai, sério? Sabe, eu tinha um pôster do Soda no meu quarto. Quando fiquei cara a cara com o Charly Alberti e ele me contou a história por trás dessa faixa, queria gritar. Imagina quando me convidou pra cantar de verdade?
PP – Enquanto público, e pensando que você é uma artista pop muito ligada ao lado visual, as pessoas conhecem muitas versões suas. Como você descreveria a Thalia fã?
T – Sou apaixonada, emocionada e a música me deixa incrédula. Não consigo acreditar ainda que conheci essas pessoas, por exemplo. De alguma maneira, firmamos uma amizade. Sinto que através dessa série conseguimos amplificar para as novas gerações esse poder que nos foi tão grandioso e importante lá atrás. Eu, como mãe de filhos de 11 e 15 anos, respectivamente, quero que eles saibam como a música mudou desde a era do vinil até a inteligência artificial que estamos vendo ser usada por aí. Quero que conheçam o processo, como se observassem uma porção de nuvens viajando sobre o mar.
PP – Deixando de lado os gêneros musicais, você sente também que assume um pouco desse lugar de rockstar? Digo, em termos de atitude. Te vejo bem “florecita rockera”! Kkk
T – Sim, eu me sinto assim (risos). Acho que sinto essa influência do rock em espanhol desde o meu primeiro disco. Se você mergulha na minha discografia, vai encontrar uma influência forte de guitarras, rifes que eram tradicionais naquela época, os refrãos… E mesmo que eu tenha feito trabalhos mais tradicionais como ‘Amor a la Mexicana’ (1997), ou me distanciado dessa estética, muitas vezes o rock acaba dialogando com um senso de atitude bastante específico que ainda vejo em mim.
PP – É interessante também pensar a influência que você acabou gerando em diferentes gerações. Em que lugar se enxerga dentro da história da música em espanhol?
T – Me sinto uma partezinha dessa grande linha do tempo composta por pessoas que só quiseram cristalizar seus sonhos e ideias, compartilhá-los através da música. No meu caso, sinto que sou uma espécie de canal, e que diante de mim existe uma ponte feita para se conectar com as pessoas. Me sinto sortuda por poder seguir fazendo isso, ter uma carreira sólida há tantos tempos, poder me reinventar e fazer coisas diferentes que continuem me desafiando. É fantástico sentir esse poder.
PP – Esse desejo por desafios se mostra bastante claro em “Psycho B*tch”, sua canção autoral mais recente. Ela é completamente diferente do restante do seu repertório: revisita seu passado e sua trajetória. Como enxerga a nostalgia?
T – Sinto que não podemos deixar as coisas se diluírem. Tudo passa tão rápido no mundo. As coisas estão tão robóticas, todo mundo fica grudado nas telas, não existe um contato tangível — algo muito diferente daquela geração que colocava uma figurinha nas cassetes, ou tirava fotos com a polaroid. Sinto que muito está se perdendo, a própria relação com o material se transforma de tempos em tempos. Por isso quis recuperar essa nostalgia, propor um outro olhar para as coisas. Convidar as gerações mais jovens a entender o que aconteceu antes que todas as coisas estivessem aqui.
***
“Thalia’s Mixtape”, a série, é uma produção exclusiva do Paramount+. O álbum, por sua vez, está disponível em todas as plataformas de música.
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