música

MC Taya se inspira em Betty Boop para EP autobiográfico com rap, funk e rock

Nascida no subúrbio carioca, MC Taya é uma multiartista que não se prende às limitações da sociedade para quem precisa viver de arte há tanto tempo.  A rapper, que está produzindo conteúdo na internet há pelo menos 7 anos, carrega um leque de influências que reflete não somente na sua estética, como também em sua música.

Em março deste ano, a artista lançou o primeiro EP da carreira, intitulado “Betty”. A musicalidade, aqui, é diversa: tem batidas de rap, rock e funk que trazem uma alma única ao projeto.

Taya traz suas próprias vivências, enquanto mulher negra, para criar uma narrativa empoderada. Para isso, ela se vale da alusão à personagem Betty Boop [ícone feminino criado nos anos 1930], cuja as referências são (quase) sempre de sensualidade e independência, para reverter o jogo e a narrativa.

(Foto: Guilherme Sena)

No EP, a artista deseja, ainda, falar sobre si e sobre sua trajetória, a partir de um ponto de vista subjetivo. Uma espécie de autobiografia.

Nesse contexto, entram as diversas referências musicais dentro do projeto: tem batidas de trap e funk com uma pitada do mundo rock — do qual, Taya é muito fã. O processo criativo, segundo ela, mergulhou nas criações de seus ídolos: Erykah Badu, Slipknot, Beyoncé e Pitty.

“Com essas músicas, a história que eu mais quero contar é a minha. Uma autobiografia, porque todas as músicas falam de mim. Eu quis ser bem pessoal, intimista, mas, ao mesmo tempo, sabia que teriam pontos bem coletivos; sabia que eu ia esbarrar em pontos onde mais pessoas iriam se identificar. Porém, é totalmente sobre a minha vivência”

Leia íntegra do bate-papo abaixo!

Papelpop – Antes de tudo, eu quero saber o que é ser uma preta patrícia!

MC Taya – Acho que ser uma preta patrícia é um estado de espírito, sabe? Muita gente acha que é uma coisa mais estética ou mais financeira. Para mim, ser preta patrícia é mais que isso. Acho que é ser empoderada intelectual, financeira e esteticamente, não importa como essa mulher preta gosta de se sentir, de ser e de se vestir. Acho que é uma questão de estado.

PP – Seu primeiro EP chega com a Betty Boop como título e referência máxima. Como você mesmo disse em uma thread no Twitter, sobre o resgate de símbolos que precisaram ser embranquecidos para ganharem espaço. Qual é a história que você quer contar com essas músicas?

MT – Com essas músicas, a história que eu mais quero contar é a minha, uma autobiografia, porque todas as músicas falam de mim. Quis ser bem pessoal, intimista, mas, ao mesmo tempo, sabia que teriam pontos bem coletivos; sabia que eu ia esbarrar em pontos onde mais pessoas iriam se identificar. Porém, é totalmente sobre a minha vivência.

Eu queria realmente denunciar a questão da invisibilidade, do embranquecimento que mulheres negras sofrem, ainda mais as mulheres negras de pele clara, né? A questão da miscigenação, também. Sempre quis passar sobre como esse processo é nocivo, prejudica e respinga na nossa criatividade e produtividade. Falo disso, então, em vários momentos. Sempre toco em como o embranquecimento e a invisibilidade me atingiram, sobre minhas profissões, minha postura e performance enquanto uma intelectual, uma acadêmica, meu diploma, minha faculdade, que eu era militante. Faço questão de passar por várias mensagens.

Em “Betty Boop”, por exemplo, falo muito sobre o poder feminino, a liberdade sexual, o atrevimento da mulher. E fecho o projeto com “Fartura e Riqueza”, falando mais de mim e da minha fé. Sinto a Betty Boop em todos esses momentos e quis colocar esse paralelo enquanto minhas vivências.

PP – Nas redes sociais, a gente conseguiu perceber que a resposta do público ao seu trabalho foi positiva, né? Os fãs tiveram muita identificação com as letras empoderadas. Como é perceber esse elo que você cria com as pessoas?

MT – É muito interessante porque tem pessoas que estão comigo há uns sete, oito anos, desde que eu comecei na internet. Tem gente que já me seguia, já eram fãs e foram crescendo e acompanhando meu trabalho se desenvolvendo e mudando, e foram absorvendo tudo isso. E tem pessoas que são novas, que me conheceram agora. Você se vê presente em várias pessoas, em vários momentos e fases. Teve gente que me conheceu quando os meus primeiros vídeos começaram a bombar nas redes sociais, eu falando sobre baby hair, sobre as tendências das mulheres negras.

Eu observo que vou criando a minha própria comunidade. Ela é bem diferente e eu sou uma pessoa diferente. Tenho um estilo diferente, e não agrado todo mundo. Não são todas as mulheres que se inspiram e se veem em mim. E, assim, eu vou criando uma base bem sólida. Não vai chegando muita gente mas, aos poucos, vão chegando grupos que vão ficando.

PP – As pessoas que ficam são mais importantes do que números…

MT – Totalmente! Eu percebo que eu tenho uma base muito sólida e muito parecida comigo; são meninas negras que, ao mesmo tempo que gostam de frequentar um baile, fazem os corres delas, gostam de rock… umas meninas malucas, sabe? [risos]. Costumo ser assim, me identifico com personalidades controvérisas. Me identifico muito com Erykah Badu, por exemplo. Descobri hoje que a Tokischa é pisciana e eu fiquei pensando: ‘só podia ser pisciana’. Piscianas são doidas (risos)!

PP – Você é que signo?

MT – Pisciana (risos), óbvio! Eryka Badu, Tokischa, Rihanna. Todas são piscianas e em todas elas eu percebo mudanças. São mulheres mutáveis, que trazem e fazem muita coisa. E eu me identifico e vejo que algumas fãs se identificam também. Eu acho que não é comum ser assim no Brasil, não são muitos artistas que são multiartistas, que fazem mil coisas como eu sempre fiz: artista, figurinistas, trabalha com marketing de influência, publicitária, etc. Lá fora, os gringos são até mais acostumados com esse tipo de postura, mas aqui não, está crescendo ainda. Percebo que as pessoas ainda estão assimilando, sabe?

PP – Super! Falando de sonoridade do EP, tem funk, rap, rock e trap, um pouco de tudo. Como foi a parte criativa do material? Quando foi que você pensou: “estou satisfeita, vamos lançar”?

MT – Sempre quis achar um ponto de tangência entre o rock, rap e funk. Sempre acreditei que os três ritmos, por mais diferentes que sejam culturalmente e socialmente, tinham elementos muito parecidos. Os três ritmos foram feitos por pessoas pretas, com uma percussão muito marcada. Comecei a reparar que eles se encaixavam muito bem. Com esse pensamento, de unir tudo isso, comecei um processo criativo insano. Sozinha mesmo, fazendo colagem de música, recortando elementos de vários artistas que eu escutava muito, referências como Beyoncé, Slipknot, Pabllo Vittar, MC Carol. Fiz muitos esses recortes de sonoridades. Depois disso, levei as referências para os produtores.

Me orgulho muito deles, inclusive, foram muito bacanas. Sacaram o que eu queria, incluindo ter mulheres em todas as faixas, o que não é fácil de conseguir, e todas elas construíram demais, foram a base do negócio. Veio todo mundo de peito aberto, sem preconceito, porque procurei trabalhar com pessoas que tivessem a cabeça aberta pra pirar junto comigo.

PP – Aproveitando que você mencionou as suas referências, queria saber: tem alguém que você quer trabalhar muito? Uma parceria dos sonhos?

MT – Nacionalmente, queria muito trabalhar com a Pitty. É o meu sonho de criança. Acho que a gente faria uma coisa muito bacana. Sou muito fã dela há muitos anos. De fora, se eu trabalhasse com Slipknot, seria um absurdo, iria amar; e com a Rihanna, que eu nem sei se conseguiria ficar na mesma sala que ela! (risos).

PP – “Betty” abre margem para a gente pensar em futuro. Você já está no mercado há algum tempo, ganhou notoriedade com “Preta Patrícia”, em 2019, lançou singles e agora um EP. O que você tem pensado para sua carreira? O primeiro álbum tá vindo aí?

MT – Por enquanto, não sabemos se o álbum de estreia vem neste ano ainda. Queremos muito trabalhar o EP “Betty”. A gente acha que tem música que precisa virar single, lançar clipe e levar mais informação sobre ele pro público. Temos que trabalhar mesmo nele! Além disso, vou continuar lançando alguns singles por fora, fazendo uns feats que saem da caixinha do rap. Talvez a gente faça uma mixtape até o fim do ano. Queremos isso porque está quase pronta. Eram músicas que eu já estava trabalhando, criando com nomes incríveis, como RDD e Tropkillaz. Vamos ver!

***

Ouça “Betty”, álbum de MC Taya, no seu tocador favorito:

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