QUEM TE CONHECE NÃO ESQUECE JAMAIS!
Falar de Minas Gerais é se debruçar sobre um estado que resguarda uma riqueza cultural abundante, para além do próprio nome, uma referência à corrida pelo ouro. Pelo menos nas últimas seis décadas, foram vários os exemplos de artistas, coletivos e gêneros nascidos neste estado brasileiro.
A gama de movimentos não apenas diversificou a produção indie e mainstream, como também tratou de expandir a visão de Minas no imaginário, já que por muito tempo o estado foi visto como uma espécie de Patinho Feio do Sudeste — isto é, diante do monopólio conquistado pelas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
Grandes festivais, nomes emergentes, movimentos musicais e o próprio teatro, entre outros aspectos, fizeram com que Belo Horizonte, a capital mineira, e companhia se reposicionassem nos últimos anos, assumindo um protagonismo inédito no mapa da cultura.
O Papelpop busca refletir um pouco do que aconteceu nos últimos anos, de modo a responder uma pergunta simples: por que Minas Gerais tem pisado tanto quando o assunto é arte popular?
Nos anos 1970, Milton Nascimento, Lô Borges e o Clube da Esquina, entre outros nomes, cantaram seu estado como ninguém, descrevendo de maneira sinestésica seus sentimentos e caminhadas por entre ruas e paisagens.
Em 2022, embora essa poesia tenha se preservado, o cenário é completamente outro. O pop parece fortalecer em si uma perspectiva cada vez mais acessível e voltada para a produção alucinada de hits. São excelentes exemplos de superestrelas que, em pouquíssimo tempo, se consagraram: a popstar Marina Sena e a banda Lagum.
Um timbre de voz é um timbre de voz, né? De Taiobeiras para o mundo, a autora do disco “De Primeira“, eleito por diversas listas como um dos melhores trabalhos de 2021, seguiu colhendo frutos de sua potente voz ao longo deste ano.
Além de ter cantado em palcos importantes como o do festival Lollapalooza e o do Rock In Rio, onde fez uma participação especial no show da amiga Luísa Sonza, Sena também viajou à Europa para uma turnê extensa e ainda encerrou este ciclo com uma parceria póstuma com Gal Costa — último registro da musa da Tropicália em estúdio.
Por coincidência, elas cantam “Para Lennon e McCartney”, canção de Milton Nascimento que faz justamente menção ao Estado em que nasceu. Especial, né?
A Lagum, uma das mais proeminentes bandas locais desde o Jota Quest, vive momento parecido: com seu som melódico, o quarteto surfa na onda de sucesso que gerou o honesto disco “MEMÓRIAS (de onde nunca fui)”, lançado há exatamente um ano.
Com mais tempo para trabalhar a própria sonoridade e pensar a direção que tomaria após a morte repentina do baterista Tio Wilson, o grupo expressou um desejo de amadurecer diante das demandas da indústria. O Papelpop, aliás, bateu um papo com eles à ocasião da estreia, que você pode ler clicando aqui.
Para quem está de olho em novidades do gênero, é preciso muita atenção! Há várias possíveis estrelas despontando no próximo ano, a começar por Paige, que com seu timbre suave vem fazendo uma interessante fusão entre pop e trap. Seu lançamento mais recente, “Garota Califórnia”, oferece um vislumbre de seus passeios por entre o bairro Califórnia (onde cresceu) e o centro de BH.
Em 2022, o cantor KDU dos Anjos, responsável pelo coletivo Lá da Favelinha, liberou o disco “Avelã”, em que se entrega de vez ao romantismo.
Ao lado dele está Nobat, cantor, produtor, compositor e agitador cultural que estreou em 2022 o disco “Mestiço”. Ainda que não seja um nome tão recente assim na cena, ele entrega no projeto uma importante mensagem sobre diversidade e autoconhecimento a partir do desejo de investigar e celebrar o Brasil.
A produção refinada de Clara X Sofia e a potência de Clara Lima, uma das mais importantes vozes negras e periféricas do Estado, também prometem ocupar espaços de maior destaque no ano que vem.
É de lei: os dias 13 de março são sempre datas esperadas pelos fãs do rapper Djonga. Quem caminha por Belo Horizonte vê com frequência seu rosto estampado em lambes e outdoors, um retrato da força que o rap possui nas esquinas da capital mineira.
Como prometido, o artista botou na rua seu sexto disco de estúdio, “O Dono do Lugar“, em que expõe pensamentos a respeito do que está em seu entorno. Ganham força temas como o racismo estrutural, suas conquistas pessoais e as demandas da indústria da música, as quais decidiu rechaçar.
Entretanto, é preciso expandir o campo de visão e observar que Djonga, apesar de ser o maior representante do gênero em seu estado, é também o porta-voz de um movimento muito maior que tem intensificado suas atividades por meio das batalhas de rap, que resistem nas periferias e são responsáveis por formar gerações de jovens.
Foi de lá, aliás, que surgiu FBC, ou “Padrim” para os mais íntimos. Entre as músicas mais tocadas do Brasil esteve “Se Tá Solteira”, peça-chave do disco “BAILE” que caiu no gosto da juventude e das celebridades, repercutindo à beça no TikTok.
Fruto de uma parceria com o produtor VHOOR, essa pérola da MPB traz de volta o miami bass e a sagacidade das quebradas mineiras, tão potentes quanto as favelas cariocas e as comunidades paulistanas — locais em que a arte se faz muito presente, a despeito do que dizem os caretas e preconceituosos.
Ao narrar o cotidiano desse espaço a partir de um viés que lhe permite criar personagens, FBC e VHOOR não se esquivam do caráter de denúncia. É pra dançar com a mão na consciência. A promessa é de que em 2023 o Padrim mude de ares e lance um novo LP.
Passados dois anos de pandemia, os festivais ganharam um novo fôlego em Belo Horizonte. O maior deles, o Breve, acontece anualmente no Estádio do Mineirão e foi um dos primeiros do grande circuito a retomar atividades em 2022, logo após a chegada da vacina.
Reunindo apreciadores de música brasileira vindos do país inteiro, o evento serviu como palco para a última grande apresentação da lenda Gal Costa (que ainda voltaria aos teatros locais), além de ter trazido em sua derradeira edição atrações como Ney Matogrosso, Pitty, Racionais MCs e Ludmilla, entre outros.
A festa já tem data para acontecer em 2023 e retorna em 22 de abril, com show já confirmado da britânica Joss Stone, do reizinho do piseiro João Gomes, a danada Ludmilla e muito mais.
O Breve também divide os holofotes com o Sensacional, proposta um pouco menor, mas igualmente interessante. Realizado no Parque Ecológico da Pampulha, o evento está focado na ideia de impulsionar a cena local, democratizando a cultura.
Com uma década de existência, a festa alimenta planos a longo prazo e também já confirmou os primeiros nomes da edição seguinte. Badalada, Marina Sena retorna à cidade em 24 de junho para um show especial que promete todos os clássicos do LP “De Primeira” e, quem sabe, faixas inéditas a serem lançadas no percurso.
Como a cena não para, cabe menção ainda ao Festival Planeta Brasil, que fez bonito ao trazer ao Brasil a musa Lauryn Hill, 50 Cent e mais. Ela voltou à cidade doze anos após seu primeiro show. Para o próximo ano, fica a expectativa para que mais nomes de peso integrem a curadoria.
Quem gosta de shows solo em BH precisa conhecer a Autêntica. Tradicionais casa de espetáculos da cidade, ela recebe anualmente os maiores nomes da MPB e disputa espaço com teatros consagrados.
Neste ano, por exemplo, já passaram por seu palco lendas como Tom Zé, Céu, Juçara Marçal, Filipe Catto, Flora Matos, Chico César, Ana Cañas, Tasha & Tracie, Rico Dalasam, Otto, MC Carol, Alice Caymmi, Carne Doce, Karina Buhr, Jup do Bairro… A lista é extensa e bem diversa.
O Bala Desejo, sensação do momento, conseguiu o feito de esgotar duas apresentações em um curto espaço de tempo. Antes de encerrar, vale lembrar que são exemplos também de boas festas por aqui a Bsurda e a Masterplano, projetos que transitam entre o pop e o eletrônico a fim de promover uma visão mais alternativa da noite.
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