Pode não parecer, mas Djavan, um dos mais célebres nomes da música popular brasileira, tem no currículo 25 álbuns de estúdio. Com sua voz inconfundível, o cantor e compositor embalou apaixonados, corações partidos e muitas manhãs frias. “D”, lançado nesta sexta-feira (12), preserva essa instância ao provocar sensações e projetar um futuro mais otimista, onde seja possível vislumbrar “um mundo de paz”.
Tendo entre seus parceiros Milton Nascimento, com quem divide as urgências da natureza, o convite é claro: Djavan quer encontrar o que há de mais vital dentro de cada um. É por isso que a letra “D”, simples e ordinária, pode significar muitas coisas. A começar pelo decifrar da canção, tão complexa em determinados momentos, mas igualmente acessível aos ouvidos. A inicial dá, também, a deixa para um processo de investigação interna em que pesa o despertar.
Para tanto, sua produção e arranjos autorais trilham um caminho de melodias e letras sinuosas, ora delicadas, ora instantâneas, passeando do folk ao funk. Nas dez novas faixas, há uma experimentação que expõe um artista em constante movimento, apto a transpor o que há de mais real à função de artífice.
Em entrevista ao Papelpop, o artista comenta o projeto e sua vontade de transformar a vida e o som ao redor.
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Papelpop – O título “D” se revela bastante enigmático, provocativo e suscita uma série de interpretações. Como um todo, você faz uma proposta à felicidade, ao futuro. Ainda é possível sonhar com utopias?
Djavan – Eu acho que se todo mundo pensar assim, a coisa não anda. É fundamental pensar positivamente, é fundamental acreditar e vender essa ideia. O horror a gente já tem. Mas temos que colocar a mão na massa e conseguir fazer com que as coisas mudem. Tenho muita esperança de que esse otimismo possa se concretizar mesmo, a situação não pode ficar pior do que está. Tenho certeza de que essa mensagem é o que há de melhor a ser dito agora.
Papelpop – Na letra de “Num mundo de paz”, você descreve noites de verão e um infinito de possibilidades que nos levam a ver o mundo de uma forma, ao mesmo tempo, complexa e ordinária. Só o amor tem esse poder de fazer com que a gente se entenda melhor?
Djavan – O amor é um sentimento master da vida. Ele é a vida e todo mundo precisa acreditar nele. Se acreditarmos, as resoluções vão ser mais bem-sucedidas, os caminhos tomados e as decisões vão ser mais acertadas. Os valores perdidos vão se conectar com a realidade. É tudo o que a gente precisa, é ter essa certeza de que, como se diz por aí vulgarmente, o amor constrói. Ele está aí pra ajeitar as coisas.
Papelpop – O dueto com Bituca, figura que guiou seus passos na formação musical, acontece no mesmo ano em que ele se despede dos palcos. O que significou essa reunião em estúdio depois de tanto tempo? Gravar com Milton te deixou ansioso?
Djavan – Com certeza. Essa experiência aconteceu pra corrigir um erro histórico. A gente se conhece há tantos anos, e nunca fizemos nada juntos. Isso, talvez, devido às nossas maneiras de ser, ambos somos tímidos e nunca nos aproximamos tanto. Com a ajuda de pessoas amigas e empresários, família, a gente chegou à conclusão de que finalmente aconteceria. Fiz a música, escrevi sobre um tema que os dois abraçam desde sempre e aconteceu. Trouxe Milton aqui pro estúdio e foi uma gravação linda. Produziu uma felicidade enorme em todos nós. Fico feliz com o reflexo que temos visto por aí depois que a faixa saiu.
Papelpop – A letra também remete a uma urgência política dos tempos. A música é a melhor forma de sensibilizar, de fazer uma mensagem relevante como essa chegar às pessoas?
Djavan – Não sei se seria a melhor… mas me parece que toda maneira de conduzir uma boa mensagem, uma mensagem de otimismo, que nos tire desse obscurantismo, é válida. E aí me estendo ao cinema, ao teatro, à pintura, à dança, às artes em geral. Todas essas frentes são canais de condução de felicidade, de reconhecimento de distintas situações. São elas que conseguem canalizar as questões que temos interna e externamente para o entendimento geral. Se envolver as pessoas naquele tema, tudo o que for possível de ser usado como elemento de condução à esperança, me parece algo bom, relevante.
Papelpop – Pelas letras, harmonias e melodias, as pessoas bateram muito na tecla de que a sua música era complexa, rebuscada. Foram 24 discos de lá pra cá… Um artista pop não pode ser complexo?
Djavan – Em primeiro lugar, eu sempre fui um artista que abraçou a diversidade, e nessa diversidade você tem tudo. A música brasileira, africana, espanhola, americana… e música pop. Sempre tive o pop nessa esteira de diversidade rítmica e de gênero. Então, pra mim, pelo menos, e pra muita gente que consegue identificar o pop dentro dessa complexidade, acaba sendo uma coisa corriqueira. Como isso foi possível? Eu também não sei (risos), mas sempre tive pela música popular um certo encanto, assim como aconteceu em relação a outros estilos com os quais decidi trabalhar.
Papelpop – Com o tempo deixou de ser um incômodo?
Djavan – No início, era colocado como sendo uma coisa que inviabilizava a carreira. Inviabilizava a minha posição musical no mundo, não era pra ser assim. Isso era pra ser, no máximo, discutido e analisado. Eu era um sujeito que continha todas as músicas em si…
Papelpop – E o propósito da música é mesmo esse, um tipo de arte a ser democratizada, compartilhada.
Djavan – Exatamente. Não era um defeito, pelo contrário, era uma coisa pra ser explorada. Me incomodava, sim. Mas se me dizem que é complexo, ao mesmo tempo, como você mesmo vislumbrou, lembro que existe um pop que a tira desse contexto tolhedor. Graças à essa diversidade, todo comentário que venha a ser feito com o propósito de limitar acaba caindo por terra. O pop é quem me salva, por estar constantemente incrustado nas minhas criações.
Papelpop – Essa letra “D” pode remeter, inclusive, ao verbo decifrar. Você é um dos grandes compositores e musicistas que temos. O que decifrou de mais curioso na música brasileira ao longo desses 25 discos?
Djavan – Eu sempre fui muito curioso, inclusive quando menino. O meu crescimento como compositor se deve a isso. Aos 13 anos, conheci um homem que tinha uma discoteca em casa, aquilo era um verdadeiro tesouro. Ele começou a me convidar pra ouvir música na casa dele, conheci o jazz tradicional com Ella Fitzgerald, Miles Davis, John Coltrane, Sarah Vaughn, todo esse pessoal influente daquele tempo, a música brasileira, nordestina, flamenga, francesa, o R&B. Ali, eu pude dar vazão a uma curiosidade imensa que eu já trazia e poder decifrar em cada gênero suas peculiaridades. Os tempos, as nuances harmônicas, os caminhos que uma faixa toma. Pra mim, foi uma riqueza incomensurável que me deu a certeza de que jamais seria um especialista feliz depois de tanta informação. Eu sempre quis ser um diverso, uma pessoa que faz uma música diversificada. Não consigo não me expor a essa diversidade, tenho uma gana enorme que não cessa. Hoje, a essa altura, ainda tenho a mesma curiosidade dessa época.
Papelpop – “Sevilhando” me chama atenção pelo fato de que propõe um estreitamento musical da relação entre África, Brasil e a Península Ibérica, sobretudo pelo título. Em termos líricos, como enxerga essa tomada de consciência do pensamento decolonial que tem se intensificado nos últimos anos?
Djavan – Tudo é uma questão política, econômica, social, cultural, que está na formação das nossas sociedades. O Brasil é um País novo, um País jovem, que está desvendando mistérios que outros países europeus já desvendou há tempos. E como a nossa história, o nosso País e sociedade são jovens, é natural que o entorno ainda este às voltas com questões coloniais muito sérias, como o próprio o racismo advindo da escravidão. Somos um país a desvendar questões que só o tempo vai trazer. O tempo e governos que admitam que são coisas que fazem parte da nossa formação, que precisam ser colocadas publicamente. Precisamos de um investimento gigantesco na educação, só através delas essas coisas vão se esclarecer.
Papelpop – Do ponto de vista cultural, que avaliação pode ser feita a esse mesmo respeito?
Djavan – Acho que estamos avançando mais do que outros quesitos. A nossa cultura brasileira é vista como uma cultura top de linha, representativa, coisas que são muito importantes para um país em formação como o nosso. Quando vou cantar fora do Brasil, vou com uma gana enorme de levar a minha língua pra torná-la exposta, conhecida… o número de estrangeiros que se dedica a aprender a língua portuguesa por causa das nossas artes nunca foi tão grande. Somos muito fortes. O que representa o Brasil como nação fora é a cultura, mais do que qualquer outra coisa. Isso é emblemático. O nosso País tem uma cultura que o representa em todos os quadrantes. Tenho certeza de que existem pessoas com a mesma consciência que tenho de continuar trabalhando pra levar a cultura pra fora, pra que sejamos mais fortes, maiores e mais importantes.
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