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Entrevista: Hodari celebra sensualidade e história de vida em disco de estreia autointitulado

Foi em janeiro de 2018 que Hodari, que até o momento trabalhava como tatuador, resolveu revelar a sua voz para o mundo com o lançamento do estrondoso single “Teu Popô”. Desde então, o músico é um dos nomes por trás de grandes sucessos de artistas como Luísa Sonza, Urias e outros. Quatro anos depois, uma pandemia no meio disso e muita inspiração, o artista está de volta com uma de suas maiores apostas até então.

“Hodari”, seu disco de estreia, ganhou às plataformas digitais na última sexta-feira (10), após muitas lutas. Durante o período pandêmico extremo, o jovem fez uma coleção de roupas para juntar fundos para as gravações, que foram feitas em conjunto com nomes que entraram com ele no projeto. Ao longo das treze faixas, Sonza e Vitão passeiam ao lado de Luccas Carlos, BK e Mikuym.

Em entrevista ao Papelpop, o artista falou um pouco mais sobre sua caminhada, desde quando tocava em bandas de emocore até seu debut solo; citou os amigos que já tatuou; a mistura de estilos musicais que encontra em sua arte; passando também pela maneira elegante e singela que aborda a sexualidade em suas músicas.

Autointitulado, ele reafirma que “esse álbum conta toda a minha caminhada”. Leia na íntegra a seguir!

(Foto: Bruno Batista)

Papelpop – Você começou sua carreira lá em cima com o single “Teu Popô” e agora, cinco anos depois, está fazendo o lançamento do seu álbum. Como você evoluiu musicalmente desde então e por que agora é o momento para o disco?

Hodari – Cara, quando eu lancei “Teu Popô”, eu era tatuador e todas as bandas [que participei] já tinham acabado. Estava muito imerso na tatuagem, nem sabia que cantava, mas levava a guitarra pro meu estúdio de tattoo e entre um trabalho e outro eu ficava tocando pra mim. “Teu Popô” surgiu nessa, acabei soltando e fiquei assustado. Foi a primeira música que lancei cantando, antes eu só tocava guitarra em bandas de emocore lá em Brasília.

Só que a música é um pouco árdua também, naquela época eu não entendia muito bem de todas as questões burocráticas que a gente sabe que todo artista, no início, sofre. E eu fui uma dessas vítimas. Isso acabou me dando uma desanimada, “Teu Popô” acabou abrindo muitas portas, mas energeticamente foi meio difícil. As pessoas com quem estava trabalhando não eram boas pessoas.

Saí de Brasília, vim para São Paulo e comecei a trabalhar com uma galera da música. Quando veio o Covid-19, já tinha gravado várias músicas soltas em estúdios diferentes, colecionando para um dia soltar. Nos três primeiros meses, de volta em Brasília, já não aguentava mais e todo mundo estava sem perspectiva, com medo do que ia acontecer. Meu medo foi virando coragem. Fiz uma coleção de roupas no meio da quarentena, vendi, levantei uma grana e fiz um projeto para gravar um álbum num estúdio que estava abrindo em São Paulo. Eles acabaram me aceitando para ser um dos primeiros artistas lá e eu comecei a escrever esse álbum. Mas antes disso, não sabia se ia lançar um álbum ou um EP.

Papelpop – Por quê decidiu autointitular o disco?

Hodari – Esse álbum conta toda essa minha caminhada. Eu saí de Brasília, de uma banda independente, filho de mãe solo, sem grana, tocando com as guitarras mais baratinhas, mas sempre me esforçando e tocando com a minha alma. De onde eu saí e chegar onde eu cheguei, às vezes, olhar para trás e poder ver essa reviravolta da vida e saber que não é só a galera que tem muita grana que vai vencer. Para mim, está sendo uma vitória e eu quis colocar meu nome no álbum porque é a história da minha vida mesmo. Parece que eu ganhei na loteria.

Papelpop – Esse projeto tem parcerias com Luísa Sonza, Vitão, BK, Luccas Carlos e etc. Como elas aconteceram? Você enviou a música para eles ou criaram juntos?

Hodari – Olhando esse casting, chega a dar uma assustada. Para um artista de primeiro chegar com uma galera assim é f*da. Cada pessoa que está nesse álbum tem uma particularidade para mim, na minha vida íntima. O BK é meu primo; o Luccas Carlos, eu conheci há vários anos em um trabalho que fui fazer num estúdio, comecei a arriscar no piano e ele chegou cantando com aquela voz belíssima. Isso há 7 ou 8 anos. No ano que mudei para São Paulo, eu conheci o Vitão antes dele lançar as músicas dele, porque eu e o Luccas fomos cortar cabelo com o pai dele. Ficamos super amigos nesse dia, ele colou em casa e eu fiz várias tatuagens nele. Mais para frente, trabalhando com o Douglas Moda, fui um dos compositores do “Doce 22” e lá me aproximei mais da Luísa [Sonza] e a gente acabou ficando amigo. Tatuei ela também. Ela acabou entrando no álbum porque somos grandes amigos e a gente anda junto.

Papelpop – Tô percebendo que você só colabora com quem você tatua, é isso?

Hodari – É verdade! O BK não tem tatuagem, mas eu tatuei a Tia Ana, que é mãe dele. Mas é mesmo, eu tatuei todo mundo, mané! Caramba, o Luccas Carlos tem, a Luísa tem, o Vitão tem (risos).

Papelpop – O projeto é uma mistura de gêneros e flerta com MPB, pagode e samba, hip hop, pop e mais. Como você chegou até essas sonoridades e como as encaixou no disco?

Hodari – Para mim, eu vejo música igual roupa. Por exemplo: você está com uma camiseta azul e eu estou com uma camiseta azul também, a gente já vai se dar bem. Agora, imagina se a gente usa essa mesma roupa um ano seguido… Vai ter uma hora que a gente vai querer usar um amarelo, vermelho, um preto, entendeu? Eu quis sair um pouco dessa mesmice de colocar em uma caixinha o que eu sou. Eu sou música e eu trabalho para música. Trabalhei com vários artistas e fui pegando um pouquinho de cada um. Eu sou um pedaço de cada amigo meu misturado com o meu pedaço também. É a minha pluralidade musical.

Papelpop – Na era do streaming, um disco com 13 faixas não é algo que vemos todos os dias. Alguns artistas, inclusive, optam por lançar materiais desse tipo em parcelas a fim de chamar mais atenção. Como você encara tudo isso?

Hodari – Eu me encontro nos anos 90, eu gosto de CD. Não tinha essa coisa de single do Red Hot Chilli Peppers, single do Lenny Kravitz, não tinha isso. Eu acho que a música é algo mais energético, quando eu lancei “Teu Popô”, estava totalmente imerso na tatuagem e foi a minha música que mais fez sucesso. Eu acho que, às vezes, essas mil estratégias que acontecem acabam tirando a naturalidade da música, sabe?

(Foto: Bruno Batista)

Papelpop – Em grande parte do trabalho, algumas em tom romântico, você exala bastante a sexualidade. Isso fica claro em musicas como “SEXO”, “Sem Menage” e outras. Como é pra você trabalhar sua sexualidade nas músicas? Como você se identifica?

Hodari – Acho muito importante o trampo que faço porque consigo abordar a sexualidade de uma forma muito singela, sucinta, elegante e que não leva para um lugar vulgar. Grande parte da música pop acaba caindo em um lugar muito vulgar e isso acaba até atrapalhando a longevidade da música, até onde a música vai chegar. Eu fiz esse álbum pensando na galera ouvir no churrasco, com a tua filha, com teu priminho pequeno e, às vezes, falo algo de sexualidade, mas que vai passar de uma forma totalmente sucinta e que só vai entender quem já tem uma experiência de vida. Eu quis falar sobre isso, mas de uma forma confortável e elegante. Faço jogos de palavras e, sempre quando falo da mulher, não é abaixando o nível, mas sempre elevando. É algo que eu não estava ouvindo ao meu redor.

Papelpop – “Sem Menage”, inclusive ganhou um clipe lindo e com uma fotografia impecável. Como surgiu a ideia para esse visual?

Hodari – Esse videoclipe eu gravei com a minha namorada e eu quis mostrar um pouco do jeito que a gente é. Às vezes, a gente se monta muito para um clipe, faz vários cabelos, vários cenários. Essa música, como compus pra ela, quis mostrar a gente de uma forma bem crua e colocando a sensualidade, tanto a masculina quanto a feminina, de uma forma elegante. Não é aquela menina que tá ali de lingerie rebolando e indo para esse cunho sexual. As pessoas devem fazer isso também, mas eu quis levar mais para o lado do carinho e poder oferecer essas imagens para a galera preta. Na minha infância, não me relacionei muito e fiquei com alguém pela primeira vez com 17 anos, isso muito pelo racismo que a gente vive aqui no Brasil. E eu já era como sou com 13 anos, só fiz tatuagem e coloquei dente de ouro (risos).

Eu fiz isso com uma delicadeza para que as pessoas possam ver, tanto os homens negros, quanto as mulheres negras, que sofrem com a solidão da mulher negra. Eu venho de uma família em que todas as minhas tias, e a minha mãe, criaram os filhos de uma maneira solo, então eu tento trazer um remédio, um respiro para todo esse sofrimento que foi construído pela sociedade que a gente vive. Quis fazer esse clipe sobre o amor entre dois jovens negros e poder inspirar não só a gente, mas os indígenas e os brancos também. É o negro ocupando o lugar do lindo também.

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