Em 2021, o mundo conheceu um nova faceta de Mano Brown. Um dos maiores rappers do Brasil virou apresentador do podcast “Mano a Mano”, assumindo o microfone não para cantar, como fez nas últimas três décadas, mas para entrevistar. Ele decidiu ouvir e ser ouvido, embarcar em discussões complexas e controversas, aprender e incentivar o acesso à informação.
Com convidados como Karol Conká, Lula, Gloria Groove, Djamila Ribeiro e Wagner Moura, a primeira temporada do “Mano a Mano” foi um sucesso e deixou um “gostinho de quero mais”. Sem delongas, o podcast retornou nos primeiros minutos desta quinta-feira (24), proporcionando aos ouvintes um bate-papo “mil grau” entre Brown e outra potência do rap nacional, Emicida.
“Eu, apesar da idade, ainda estou em aprendizado. Tem gente bem mais jovem do que eu que sabe mais do que eu. Emicida é um. Ele sabe muito. Djonga é outro. Tem uma gente jovem que aplica conhecimento na profissão. E o conhecimento tem que ser compartilhado”, reflete Brown em recente coletiva de imprensa.
Conhecimento é mesmo a palavra, ainda mais nesta segunda temporada do “Mano a Mano”. O artista intensifica os debates sobre sociedade, política, saúde, arte e esporte no Spotify, abrindo a nova leva de episódios com Emicida e indo à jornalista e diretora do Instituto Fogo Cruzado Cecília Oliveira, ao jornalista André Caramante e ao neurocientista Sidarta Ribeiro.
“A entrevista com Sidarta foi excelente, de utilidade pública, essencial para o momento que a gente vive. Assuntos ligados à legalização da maconha, ao uso de CBD [canabidiol] para tratamento de várias doenças, à parte da alimentação e agrotóxicos foram abordados”, antecipa Mano Brown.
Os temas e convidados são variados, escolhidos a dedo pelo apresentador e sua equipe. Os nomes que já estão no radar do programa prova isso: o futebolista Pelé, a ex-presidente Dilma Rousseff e o cantor, compositor e ator Seu Jorge. “Ele é um cara que tem muito a acrescentar em relação a cinema, brasileiros fora do Brasil, negros fora do Brasil. A gente precisa saber como é isso. Seu Jorge tem muita ideia para trocar”, diz Brown.
Com essas trocas de ideias gerando uma diversidade de pensamentos, ele se desafia: sai da zona de conforto e entende que pode estar expondo suas fragilidades, como seus medos de errar ou de não fazer uma pergunta boa a um entrevistado. Nesse processo, Brown tenta criar um clima de amizade e aprender a controlar a ansiedade para conduzir a conversa.
“O cara fala uma coisa interessante e eu quero imediatamente abrir uma vírgula e perguntar sobre aquilo, mas tenho que deixá-lo fechar o raciocínio. Muitas vezes, tenho que me conter e não esquecer a pergunta. O que acontece? A ideia continua, ele fala outras coisas interessantes e eu acabo esquecendo”, conta.
Afinal, como gosta de ressaltar, ele não é um profissional de Jornalismo. “Eu represento os leigos. Eu sempre digo: ‘olha, prefiro me colocar no lugar do cara que sabe pouco, então faço perguntas, que também vão servir para outras pessoas’”.
Mas existe um diferencial em Brown: a vontade de saber. No “Mano a Mano”, o artista mostra que é estudioso e interessado em muitos assuntos, incluindo teologia, que nunca abordou profundamente em outro lugar mas aprendeu a gostar, e segurança pública, que traz para a segunda temporada.
“São temas delicados e você pode entrar em conflito com os seus porque não existe um consenso. São temas abertos para novas opiniões sempre. Mas eu pago o preço quando me coloco na dúvida. O público também te põe em dúvida: ‘Cadê aquela convicção do Brown que eu abracei? Agora ele está se questionando? E eu?’”, revela o podcaster. “Se questione também. A gente é uma metamorfose ambulante”.
Reconhecer que “a unanimidade não existe”, como acreditava Nelson Rodrigues, faz com que Mano Brown dê continuidade aos estudos e aos questionamentos para ampliar a própria visão do Brasil e do mundo. Para o rapper, é assim que ele finalmente deixa “um lugar marginal no imaginário” do público, das pessoas que antes o consideravam “um cara ignorante e intransigente”.
Ele chegou a desconfiar da própria intelectualidade e inteligência, sendo “obrigado a viver com alcunha de um cara burro” ao longo dos anos no rap. “Muita gente falou: ‘estou surpreso em ver o Brown abordar tal assunto’. Teve um cara que estranhou esses dias porque eu falei que sou taurino”, relembra.
“Ele acha que, porque canto rap, eu vivo aonde? Eu tenho que saber de mim mesmo. Sou taurino, tenho fome o dia inteiro, tenho preguiça, gosto de conforto, roupa, perfume, boa música e boas amizades, sou teimoso até umas horas. Se me convidar, tem que ter comida e sofá para eu ficar de boa ouvindo um som. Não me põe de pé com fome que estraga o rolê”, brinca.
Pois Brown acredita no conhecimento, inclusive como mecanismo para garantir um futuro melhor para os brasileiros, e em disseminá-lo. Segundo ele, o país precisa de um projeto de escola e faculdade para os jovens. É isso que espera caso Lula, que entrevistou na primeira temporada do podcast, ou qualquer outro político vença as eleições presidenciais deste ano.
“Seria imperdoável se os próximos governantes, seja lá de qual lado for, não investirem nisso. Se eles estiverem falando que o Brasil vai melhorar, mas não colocar escola para o povo, eles são mentirosos, hipócritas, safados. É a escola que vai salvar os jovens. O Brasil vai ser um país riquíssimo se isso acontecer, vai exportar inteligência para o mundo”, avalia Mano Brown.
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