Voltar para o topo

Agora você pode adicionar o PapelPop a sua tela inicial Adicione aqui

Disponível a partir das 20h30 de hoje, segundo disco da carreira exalta maturidade sentimental e cultura popular brasileira (Foto: Gabriela Schmdt)
Foto: Gabriela Schmdt
música

Duda Beat sobre novo álbum: “Amores não acabam, eles se transformam”

Um coro de vozes irrompe entre palmas, cantando versos premonitórios. “No sereno tem gente que tá roendo/amanhã vai morrer do coração“, diz um dos repentistas. Os tais apaixonados, pegos de súbito pelo desejo e suas fases, são os grandes personagens da primeira faixa de “Te Amo Lá Fora”, novo disco de Duda Beat. Lançado na noite desta terça-feira (27), exatos três anos após o bem-sucedido “Sinto Muito”, o projeto é uma aposta mais confiante da artista.

A estreia soa como a peça-chave de uma jornada progressiva em que o afeto, tal qual escreveu o poeta Carlos Drummond de Andrade, se transforma em “um privilégio dos maduros”.

“Eu sinto que todo ser-humano nasce com uma capacidade plena de amar, mas esse amor próprio, de relacionamento, só vem com um limite que você se dá”, diz Beat, em entrevista por telefone. “Quando você ama uma pessoa e ela não te quer, você sofre por isso. Mas chega num momento que você entende que precisa se amar mais. Esse sentimento eu vejo como algo que se aprende nos pequenos gestos da vida, observando”.

Maturidade, aliás, é uma palavra recorrente em vários sentidos. A já característica identidade firmada em seu encontro com o eletrônico, fruto de uma parceria bem-sucedida com a dupla de produtores Lux & Tróia, é potencializada nos detalhes, onde residem os avanços e a consequente prova da mudança de rumos.

https://www.instagram.com/p/COBmM6mp9K_/

Mais fluida e sisuda, a voz que ganhou notoriedade nacional com o hit “Bixinho” recebeu apoio de uma professora de canto ao longo do último ano. Isolada no mato, também usou o tempo livre entre os compromissos para avançar em pesquisas de som e pautas pessoais, entre elas o autoconhecimento.

“Houve uma evolução emocional muito grande nesse meio tempo entre um trabalho e outro”, avalia. “Eu comecei a enxergar mais de longe as relações que eu tive. Nesse segundo álbum, minha perspectiva de emoções, letras, a própria melodia dão a entender que quanto mais eu me distancio desses amores, mais consigo ver com clareza as situações, o que eu sentia. Estou em paz comigo mesma e só o tempo traz isso pra gente”.

Nascida no Recife, ela vai fundo na própria formação a fim de expandir a paleta sonora. Introduz agora gêneros como ciranda, coco, xote e reggae para reforçar novos contornos no pop brasileiro, um espaço que tem conquistado com graça e que parece desapegar, em nichos menores, de essências pasteurizadas.

“Eu cresci ouvindo gente como Lenine, Nação Zumbi e Maracatu”, diz. “Todos essês gêneros, além do brega, do baião e do forró, sempre estiveram muito presentes na minha vida. A vontade de colocar isso junto em um projeto meu foi enorme desde o começo. Agora, observando o que eu fiz, parece ter vindo de uma forma mais consistente porque eu acabo trazendo elementos que se misturam naturalmente com o universo pop. É uma grande homenagem à minha terra”.

As participações escolhidas têm papel fundamental nessa declaração de amor. Em “Tu e Eu”, um dos grandes momentos no quesito produção, canta Cila do Coco. Imponente nome da música brasileira, a artista já participou de trabalhos do Nação Zumbi e, muito antes de aceitar o convite de Duda, também atuou por quatro anos ao lado da banda belga Think Of One. Foram dois álbuns gravados e uma turnê na Europa.

O provocante pagodão baiano “Nem Um Pouquinho”, parceria com o rapper Trevo, é a faixa mais potente do LP e a que evidencia os muitos passeios sonoros feitos pelos produtores. Um clipe também seria gravado para estrear nesta terça, impulsionando o desempenho do projeto no streaming. A decisão mais acertada acabou sendo um adiamento, em virtude do aumento de casos da Covid-19.

O que não se pode negar é que “Te Amo Lá Fora” está cheio de canções que, ao menos em teoria, se revelam sombrias nos primeiros minutos para então se desdobrarem em estruturas agridoces. O caminhar da obra vai sempre em direção aos lugares mais inesperados.

“Ter essas pessoas no meu disco é uma alegria muito grande porque eu sinto que o mundo precisa conhecer essas pessoas. É gente que me emociona desde sempre, que embarcou nessa busca por referências. A minha vontade e dos meus produtores foi realmente trazer o que o Brasil tem de melhor e misturar isso a outras descobertas. Acho que ‘Te Amo Lá Fora’ é fruto de uma mistura equilibrada”.

Ainda é possível reconhecer fórmulas antigas. “Melô da Ilusão”, por exemplo, foi retrabalhada após ter sido descartada da seleção final de “Sinto Muito”. No entanto, é na ousadia que se oferecer o envolvimento necessário para sacudir festivais inteiros – ou neste contexto, a sala de casa. Cabe citar as radiantes “Mais Ninguém” e “Decisão de Te Amar”, bem como o reggae “50 Meninas” – uma canção que já clássica em seu repertório ao versar sobre esforços inválidos de conquista.

“Por favor me entenda
Se eu não quiser te ver mais, não
Eu já sabia que na sua fila
Tinha mais de 50 meninas
Todas elas apaixonadas por você”

As decisões criativas da vez abraçam ainda um ensaio fotográfico que se finca entre a beleza solitária da década de 1960 e o glamour esfuziante dos anos 1980. O clique da capa, feito por Fernando Tomaz com direção criativa de Marcelo Jarosz, traz uma Duda Beat com o rosto velado. Entre as maiores referências, ela cita o cinema noir francês e a cantora britânica Kate Bush, um ícone da arte estética. “A coreografia de ‘Wuthering Heights’ é uma sequência de passos que já está no meu ser. Quantas vezes já me gravei dançando isso… um dia tomo coragem pra divulgar”, brinca.

Foi também de uma memória afetiva, guardada desde a infância, que a artista extraiu o título. Durante uma das várias aparições da cantora mexicana Thalia na TV brasileira, o apresentador Gugu Liberato se volta para a convidada e diz: “Tem gente de fora que te ama aqui também”. A resposta dela, à época estourada nas rádios pela exibição local das novelas que fez, foi em um portuñol dedicado. “Te amo la fuera”.

Duda ri ao lembrar do episódio e afirma que, também pelo fator afetividade, o mesmo acabou se entrelaçando ao desejo atual de falar aos fãs em um momento marcado por desafios.

“Quero que as pessoas entendam seu lugar escutando esse disco. Já recebi inúmeras mensagens falando sobre como meu debut ajudou no fim de um relacionamento, de um casamento, até. Pude entrar no coração das pessoas. Mas agora é hora de dar poder, pra que as pessoas ouçam e compreendam que os amores não acabam, e sim se transformam. O que foi precisa deixar algo de bom, uma adição, um amadurecimento, uma vontade de se amar muito grande”.

A vontade de estar nas pistas mais clássicas aparece por meio de um house. A faixa que encerra o disco, “Tocar Você”, acena para o gênero que voltou a bater ponto em produções de grande alcance em 2020, entre elas as mais recentes de Kaytranada e Lady Gaga. Embora goste do lugar em que está e assuma a responsabilidade de ser uma hitmaker, a cantora diz que os tempos de baladeira ficaram pra trás.

“Tem dias que estou super animada, mas te confesso que dar uma deitada é sempre um lugar muito feliz pra mim”, ri. “Antes da pandemia, fui pra algumas festas de house e em algumas situações me sentia incomodada. A batida sem letra me fazia pensar na conta a ser paga, na lista de afazeres do dia seguinte. Quis brincar com o gênero, mas sem deixar as pessoas se perderem”.

Se há paz, há também perdão. Ao abdicar do título de drama queen, que foi por um tempo atrelado ao seu nome com insistente frequência, Duda Beat assume hoje uma postura mais realista. Finca os pés no chão para se dizer debochada, desiludida, mas não menos envolvida.

A síntese do que as múltiplas filosofias contidas em “Te Amo Lá Fora” querem comunicar talvez esteja em “Meu Piseiro”, primeira faixa a ser divulgada e mais uma prova do faro de seu time de criadores visto que hoje a pisadinha é líder absoluta em reproduções nas rádios e plataformas.

“Pra mim ‘tá tudo perdoado
Ninguém é obrigado a me amar assim
Morri, eu fiquei aos pedaços
Mas tu não é culpado de não me amar assim”

Os números não são o foco. No último verso, o tom do discurso é de redenção. Uma tentativa de abraçar a si mesma, mas também de mostrar que está aberta a pensar.

***

“Te Amo Lá Fora”, o novo disco de Duda Beat, já está disponível. Ouça em seu streaming favorito.

 

voltando pra home