Em 2020, as noites de fado, famosas festas embaladas pelo tradicional gênero musical português, ficaram restritas à individualidade das janelas. Conhecido no mundo todo por exigir dos intérpretes um canto apaixonado, que parte da alma, o ritmo nunca impôs ao ouvinte barreiras de compreensão. No fado, meio e mensagem se entrelaçam a fim de criar uma narrativa que faça com que o essencial seja o sentimento.
A cantora portuguesa Ana Moura que o diga. Considerada uma joia que traz na voz o condão necessário para transformar situações desoladoras em melodia, ela lança nesta sexta-feira (26) o single “Vinte Vinte (Pranto). O título é autoexplicativo. Sem dar espaço a festividades, homenageia vítimas de um torturante ano em que o ar e o afeto nos foram privados.
Quem a ajuda nesta missão é uma dupla de amigos e parceiros musicais: além da delicada produção de Branko, integrante do respeitado grupo Buraka Som Sistema, ela entoa versos escritos pela potência que é Conan Osíris, um dos principais nomes da cena pop portuguesa e ex-participante do concurso Eurovision. É dele a canção “Telemóveis”.
Velando metaforicamente esta tragédia anunciada, o trio caminha em luto pela ruas estreitas de uma cidade sitiada pela peste. O único interesse parece ser reproduzir um ritual que vislumbra a garantia de dias melhores. Desta curiosa associação que funde as arte tradicional e o contemporânea, é possível ouvir dentro do silêncio corvos cantarem. A morte, enfim, abre espaço para o recomeço.
Uma das artistas portuguesas de maior relevância, Ana Moura já cantou com Prince e os Rolling Stones. Nascida em Santarém, na região do Alentejo, a cantora lançou o primeiro disco da carreira em 2003 e é considerada hoje uma das maiores de sua geração – embora só tenha abraçado o fado anos mais tarde.
Também com raízes fincadas na música portuguesa, Conan Osíris é outro que se destaca não apenas por suas composições engenhosas, marcadas pelo romantismo trágico, jogos fonéticos e expressões populares. Há também um padrão estético que o deu projeção em 2019, ano em que decidiu inscrever uma canção sua no Eurovision, principal concurso de televisão da Europa.
Igualmente alinhado no que diz respeito a criatividade, Branko (João Barbosa), por sua vez, é integrante do Buraka Som Sistema desde 2006. O quarteto, formado ainda por Kalaf Ângelo, Blaya e Andro Carvalho, ocupa um importante espaço na cena alternativa há uma década e meia por apostar em uma sonoridade bastante particular que se centra no kuduro – uma febre nas pistas de países lusófonos da África e Europa.
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