Urias nunca entrega um lançamento sem fazer o dever de casa. Nesta quinta-feira (12), a artista liberou nas plataformas digitais o clipe de “Racha”, complemento de uma canção que esmiúça jogos de palavras e os muitos entrelaçamentos existentes entre sua vida e obra.
Ela, sendo uma mulher trans, luta pra conquistar o próprio espaço – uma batalha incessante, metaforizada no registro audiovisual pela velocidade dos carros de corrida. Referências elegantérrimas de moda, voguing e storytelling… estão todos aqui.
Nesta entrevista, a artista fala sobre referências, retorno à música após meses de isolamento e a preparação de um primeiro álbum de estúdio. “É para o ano que vem. As pessoas que acompanham meu trabalho vão ter acesso a um outro lado meu que não mostro muito”.
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Phelipe Cruz: Que clipe bonito e cool, Urias! Parabéns!
URIAS: Ai, que bom que você gostou. Obrigada.
Você tem trabalhado com a família criativa que tem a Pabllo, o Chamaleo, o pessoal da Brabo Music. Como foi ficar esse tempo distante. Chegou agora a matar a saudade dos meses de isolamento?
URIAS – Foi rapidinho nas vezes que nos encontramos, mas já deu pra matar a saudade. Melhor do que nada!
E como é trabalhar com quem você também tem uma amizade? É fácil separar as coisas?
A gente consegue separar as coisas direitinho, porque quando temos que entregar algum trabalho as coisas não vão sair como eram pra ser se alguém não se entrega totalmente. A gente tem noção disso. Antes de mim e da Pabllo, o Gorkynho já trabalhava com música. Ele tem muito essa bagagem pra passar pra gente, sabe? Essa noção de como trabalhar.
Como você se vê como artista no Brasil lá na frente? Você tem 26 anos e sua cabeça deve estar fervilhando, ainda mais com um trabalho tão sólido e bonito. É uma pergunta meio de entrevista de trabalho, né?
Amo! Sou uma pessoa que pensa muito alto, então já estou assim, ó… carreira internacional, pensando assim em coisa de cinco anos. Então fico tipo “preciso fazer e correr”. Sonho muito alto, mas sei separar e manter o pé no chão nas coisas, dos nossos limites, porque não é “eu quero e eu vou”. Mas tenho planos de me lançar e expandir meu público pra além do que ele é hoje, pras pessoas escutarem e entenderem todo o rolê que eu quero falar. De uma voz, vida de uma corporeidade de um corpo como o meu.
Conta pra gente do poder de um “Racha” e de uma “Racha”? [Risos] Explica pra gente sobre a ideia da letra e do clipe?
A letra e o clipe são sobre a exaltação de corpos como o meu, sabe? A gente estava comentando sobre como conseguimos entregar a excelência tendo só acesso à precariedade, é nesse sentido de que… se isso aqui fosse uma corrida, meu corpo, minha máquina, meu carro estaria muito mais bem preparado. É sobre como estou adiantada nessa corrida, que, se fosse justa, eu já teria ganhado só de entrar nela. Porque se nessa situação já entrego coisas que pessoas aí com muitos privilégios não entregam… eu tenho que deixar a modéstia à parte e exaltar meu trabalho. Se eu não enxergar isso no meu trabalho, ninguém vai enxergar. É a exaltação do meu corpo, que é o corpo evoluído. É o próximo passo.
Senti muito “Scream” do Michael e da Janet Jackson nesse clipe! Não sei se era uma intenção… Esse é o videoclipe mais caro de toda a história…
Que bom que você pegou a referência! Como falei, sonhei alto e imaginei um clipe estrondoso, no nível “Velozes e Furiosos”, um carro pulando de um prédio pro outro. Aí parei e pensei “calm down, girl”. Estamos aí numa pandemia, não dá também… não é nem uma questão só de budget agora. Pensei muito a coisa do preto e branco, que vou trazer a partir de agora. Porque apesar de não ter a cor, traz texturas que te dão brechas pra imaginar várias outras coisas e cores. Por exemplo, o carro do vídeo era verde… Quis trazer essa coisa e pretendo continuar vendo as texturas, até na parte sonora, trazendo essas sensações.
Quando a gente fala de referências de clipes que você viu na adolescência, quais são os que você ama?
Quando eu era muito pequenininha, minha família fazia o almoço de domingo na casa de algum parente. E pra deixar as crianças quietas, alguém sempre tinha um DVD de, digamos, uma fonte alternativa… que chamava tipo “Hip Hop 2000”. Uma coisa que me chamava muito a atenção eram as Destiny’s Child, tenho que ser sincera. Quando entrei pra dança de rua, aos sete anos, meu professor me mostrou o vídeo delas dançando, que era o mesmo clipe que eu via na casa das minhas tias, de “Lose My Breath”. Meu professor passava e dizia “vocês têm que querer ser elas”, “nessa parte do vídeo elas estão só andando, mas elas ESTÃO ANDANDO”, aí isso sempre me marcou. Elas foram meu primeiro contato com videoclipe e coreografia.
E de rap e hip hop?
Lembro muito de 50 Cent, Snoopy Dogg, Usher… nossa, eu e minhas primas quando ouvíamos Usher, a gente já ia pra sala pra ver o clipe, ver ele dançando. Gato! Tinha o Akon também, que era a sensação da minha família.
E dá muito pra fazer uma relação dessas suas referências com o que você faz agora, né?
Sim, vejo muito!
Sua videografia já está muito bonita! Tem “Diaba”, “Rasga” e agora “Racha”. Esse single entra em qual trabalho?
Muito obrigada! Faz parte do álbum mesmo. Nem sei se eu podia falar isso! [risos] a gente vai trabalhar num disco pro ano que vem. Estamos trabalhando há algum tempo. Vai ser muito incrível. As pessoas que acompanham meu trabalho vão ter acesso a um outro lado meu que não mostro muito. E às vezes nem gosto de mostrar, porque não é esse lado muito forte, sabe?
Você vai estar mais vulnerável, então, nesse disco?
Também! Tem tudo, vão ter muitos momentos que vivi. Tem o yin e o yang da gata.
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Ouça “Racha” também no streaming.
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