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Review: Machine Gun Kelly ironiza comportamento humano em “Tickets to my Downfall”, novo álbum
“Todos me questionam ‘Por que você está mesclando gêneros?’. Eu não estou. Sou apenas um cara versátil que faz coisas que geralmente vão dizer que não se pode fazer. Por que não posso fazer? A música é uma forma de expressão tão bonita, com uma linguagem própria que, por exemplo, algumas pessoas no Brasil, pessoas que talvez nem falem inglês, conseguem entender e sentir algo bom emanando. Não quero ser inacessível, limitado”.
Colson Baker, vulgo Machine Gun Kelly, ainda não tinha nascido em 1980 quando o Blondie, a banda mais pop nascida na cena punk, foi praticamente expulsa do lendário CBGB. Os frequentadores mais ortodoxos da casa, que fechou as portas em 2006 e viu nascer movimentos como o punk e a new wave, diziam que havia algo de traíra na atitude do grupo liderado por Debbie Harry.
Diferente de nomes como Patti Smith, Television e B-52, a banda cruzava cada vez mais a fronteira pop, rendendo-se aos charmes da indústria.
Para além da ignorância alheia, o que há de mal nisso? Absolutamente nada. Mas mesmo que não tenha vivido esse período, o artista americano de 30 anos age de forma semelhante ao ignorar eventuais “haters”. Nesta sexta-feira (25) Kelly lança o disco “Tickets to my Downfall”, projeto que sucede “Hotel Diablo” (2019) e aparenta dar novos contornos ao chamado pop punk.
Com produção executiva do astro do rock Travis Barker (blink-182), o cantor entrega uma mistura de influências que reforçam sua imagem de ídolo rebelde. Isto porque as canções, que exploram os muitos graus de complexidade existentes no comportamento humano, são marcadas por um tom irônico.
Aos poucos, o autor vai revelando uma ótica peculiar dos acontecimentos recentes da própria vida e do que o cerca, de modo que o planeta chega a parecer em certa altura a uma espécie de reality show de baixo orçamento.
“O mundo está ardendo em chamas e ao compor ‘Concert for Aliens’ fiquei pensando o quanto nossos governantes são estúpidos e não sabem o que fazer. Em como as pessoas ao redor do mundo acreditam em qualquer coisa que qualquer pessoa diz ou escreve por aí. Acho que os extraterrestes, fora da terra, olham pra gente e acham que isso aqui é um tipo de comédia”.
Mas não é só. Kelly vai além e busca pensar os rumos do próprio som, que cada vez mais se mostra aberto a um hibridismo. “Minhas expectativas em torno deste lançamento é de que a partir dele exista uma mudança na forma com que enxergam certos nichos, a cultura”, diz.
Vencedor do prêmio MTV VMA na categoria Vídeo Alternativo (Sobre a apresentação sem plateia, diz ter sido “uma das coisas mais estranhas que já experienciei na vida”), o cantor afirma que deseja fazer de “Tickets To My Downfall” uma espécie de testamento sonoro. “Há magia, há sonhos, e embora as pessoas sigam vendo tudo sob sua ótica quadrada, quero que daqui a 10 anos olhem pra isso e vejam o pop punk, o hip hop mesclado a guitarras, como um tipo de vanguarda”.
Ao se atualizar e permitir seguir essa torrente criativa, que aliás tem aproximado nomes como Post Malone e Frank Ocean de outros públicos, Baker consegue conectar o presente ao passado. Apesar de mirar o amanhã, o cantor não deixa de mexer com a memória afetiva dos fãs ao emplacar faixas como “WWIII” e “lonely”.
Ambas são ótimas demonstrações da veia criativa de seu produtor, que inevitavelmente acaba se apoiando na fúria sonora do blink-182 ao moldar a identidade das faixas.
No meio dessa profusão de gêneros, sensações e desejos, é claro que ainda há espaço pra falar sobre amor – mesmo que o fruto dessa reflexão seja o fato de que o mundo se contradiz a todo momento, sem dar qualquer chance de resposta.
“Quando você se apaixona por alguém, você pode acabar se machucando pra valer se isso acaba”, explica. “Quando dizem que é a melhor coisa da terra, não é estranho? Funciona quase como quando alguém se conecta com Deus, é tudo extremamente poderoso ao ponto de fazer com que as suas atitudes mudem. Pra mim, aliás, Deus sempre foi uma mulher”.
Da mesma forma com que lança um olhar sagaz para o comportamento de figuras e ícones tão comuns à humanidade, Baker parece mesmo querer dizer que independente das críticas e do puritanismo sua arte é livre. Nem mesmo as mais densas preocupações, que não são poucas, serão capazes de fazê-lo parar.
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“Tickets To My Downfall” está disponível no streaming. Ouça na sua plataforma predileta.
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