Não demorou muito para que MC Tha fizesse de “Rito de Passá”, seu álbum de estreia, um dos trabalhos mais elogiados pela crítica. Vinda da periferia de São Paulo e disposta a iniciar um diálogo com o mais plural dos públicos, a cantora foi vendo seu público crescer e o desejo se tornar em realidade. Com um empurrão da internet, o disco se tornou popular entre jovens de todas as classes sociais.
A obra, lançada há um ano, entrega uma mistura engenhosa de funk com MPB. Mais do que isso, bebe na fonte de outros gêneros genuinamente brasileiros a fim de mostrar a abrangência musical de seu berço. E se o Estado é laico, ao menos teoricamente, MC Tha faz valer o seu direito ao empregar uma estética, lírica e visual, que dialoga com os princípios da fé umbandista. Caminhos foram abertos e o principal deles com toda a certeza foi o da representatividade.
Neste sábado (12) a cantora pede licença pros trabalhos começá. Após mais de 6 meses afastada dos palcos, Tha se apresenta na edição online do Coala Festival, um dos mais tradicionais eventos musicais do País. Pela primeira vez, o evento dá adeus ao Memorial da América Latina e parte rumo a um refúgio em meio à natureza. Com equipe reduzida e sem público, o evento tem transmissão online e gratuita na internet.
Nesta entrevista, Tha fala entre outras coisas sobre a expectativa de voltar aos palcos, a admiração que sente pelo headliner, Gilberto Gil, e suas profissões de fé.
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Papelpop: ‘Rito de Passá’ chegou há pouco mais de 1 ano (ficou em #4 na nossa lista de 20 melhores). Ainda é uma estreia relativamente recente, mas que balanço você consegue fazer desse período? O que de mais bacana esse projeto te proporcionou?
MC Tha: Tem uma lista imensa de coisas que eu podia ficar aqui escrevendo, mas acho que uma das coisas principais foi provar pra mim mesma que eu não estava louca. Que eu consegui transformar minhas ideias em realidade seguindo meu coração e o que é confortável pra mim!.
Quando lançou o LP de “Rito de Passá” você disse que vinha se preparando para uma série de mudanças. De fato, estamos passando por elas, mas sob uma ótica bastante negativa. Como tem se sentido ao longo desses meses? Eu mesmo tive várias fases: a da yoga, a das festinhas no Zoom, a dos cursos online e claro, a da tristeza…
Eu acho que faz parte, sabe? Minhas mudanças eram todas sobre uma perspectiva de acender e realizar sonhos. Mas não entendo que não são mais possíveis, somente que este não é o momento. Todo mundo está passando por transformações e lidando com coisas que passou a vida toda negando. E embora estejamos passando por um período coletivo, é um processo individual. Tem gente que vai entender e tem gente que vai continuar o mesmo ser humano lixo. Eu tenho me sentido muito em paz, sentindo falta do movimento, sentindo muita saudade, com as emoções fora de equilíbrio, mas faz parte e em geral estou em paz e pronta para dar continuidade as coisas.
Tha, ainda existem muitos estereótipos a serem quebrados porque a gente sabe que a música pop brasileira ainda tá engatinhando e se baseia muito em um padrão norte-americano, branco etc. Como é pra você, uma menina que veio da periferia, ter a oportunidade de levar sua música pro mundo e fazer com que jovens com uma origem e uma realidade semelhante se vejam representados ali?
Eu acho bonito porque tudo se deu de forma natural, partiu primeiro de uma necessidade interna de fazer o que fosse confortável pra mim, nunca teve a pretensão de transformar ou quebrar barreiras. Era meu pra mim mesma. Talvez não absorver o externo me deu força interna para acreditar e botar na mesa o que eu sou e não ser a cópia de alguma artista pop com uma fórmula repetida que da certo sempre. Fico feliz porque digo que meu trabalho é provar que é possível e reatar o nosso contato com a nossa fé interior e isso tem acontecido, sinto isso a casa mensagem bonita que recebo de pessoas reais.
Você também emprega no seu trabalho elementos da religião, tema com o qual você possui uma grande proximidade. Acho muito bonita a forma com que você e outros nomes como Luedji Luna criam esse diálogo com o público. Percebo também uma resposta positiva… Como você observa essa troca?
Tem um tempo que tenho entendido que as pessoas estavam carentes de se conectar com jovens que levantam essa bandeira da religião, como no meu caso. Eu sou Umbandista e divido meu tempo entre palco e terreiro, a minha vida verdadeiramente gira em torno disso. Tem muita gente nova que me segue e que também não se esconde. Acho que é disso que precisamos, de não ter medo e nem vergonha. Deve ser gostoso demais acompanhar uma artista semi-pop (risos), apontar e falar que ela “também é macumbeira” porque o que a gente vê é justamente o oposto disso. Cantoras demonizando tudo o que não é “Deus” e “Jesus”. Eu me senti bem quando fiz a live com a Leci Brandão, foi mágico porque ela fala com tanta naturalidade sobre os nossos mistérios, sabe? É um exemplo a ser seguido, naturalizar e desmistificar a nossa presença na sociedade.
Até então os festivais vinham transmitindo as suas edições virtuais das casas dos próprios artistas. Com o Coala isso se modifica… É uma nova alternativa. Gosta da ideia? Como está a sua expectativa para esse retorno aos palcos?
Eu gosto muito porque da esse movimento que tanto sinto falta. O Coala está tomando todos os cuidados, testes na passagem de som e teste no dia do evento para que tudo saia bem! Além disso, nem todos os artistas independentes tem equipamentos de qualidade em casa ou conhecimento técnico para conseguir executar seu show, às vezes nem tem espaço então a live não sai boa! Com o evento conseguindo dar essa estrutura e o cachê a coisa fica bonita!
Existe agora um debate sobre os shows em esquema drive-in e outros tipos de evento que acabam sendo um pouco mais arriscados. O que você pensa a respeito desses projetos?
Eu falei pra Letz que trabalha comigo negar todos. Meu público não tem dinheiro pra pagar 15 reais num ingresso, sei que eles se esforçam pra ir aos shows, como que vão pagar caro e arrumar carro pra ir em show drive-in? Não é acessível para as pessoas que me acompanham! Eu mesma não consigo ir a um show drive-in.
Gilberto Gil é o headliner desta edição do Coala. Você é fã, costuma acompanhar? Tá ansiosa pra ver algum show específico?
Eu amo Gilberto Gil, acho um fofo, talentoso e fundamental para o Brasil e vou tentar um feat sim! Não sei porque mas sempre que eu sonho com ele eu estou indo pedir pra ele acender a vela de anjo de guarda dele #sonhosdemacumbeirah. Eu queria assistir ao show dele mas acho que não vai ser possível pelas medidas de segurança do Coala. Mas assisto pelo YouTube quando eu chegar em casa! O povo fica perguntando de feat… eu quero feat só com os veteranos: Leci Brandão, Gilberto Gil, Lia de Itamaracá (risos)
Você apresenta um show de pop completo com figurinos, efeitos especiais… uma produção pra ninguém botar defeito. No Coala imagino que não será diferente. O que os fãs podem esperar?
Acho que vai ser emocionante porque vai ter Rico Dalasam com o trabalho sensível que ele lançou recentemente. O que eu acho que conversa com a sensibilidade do meu show.
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O Coala Festival acontece neste sábado, das 14h às 22h. O headliner é Gilberto Gil, que se apresenta ao lado do trio Gilsons, formado pelo filho, José, bem como pelos netos Francisco e João. Você pode apoiar a cena e fortalecer os envolvidos no evento por meio de doações. Acesse o link e saiba mais: http://totalacesso.com/
14h: Abertura Coala
14h05: Show 1 – Mariana Aydar e Mestrinho
14h50: DJ Set 1 – Mary G
15h30: Show 2 – MC Tha e Rico Dalasam
16h15: DJ Set 2 – Shaka x EB
16h55: Show 3 – Novos Baianos
18h15: DJ Set 3 – Cinara
18h55: Show 4 – Nego Bala
19h40: DJ Set 4 – Ubuntu
20h20: Show 5 – Gilberto Gil + Gilsons
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