Em abril, o rapper Ramonzin lançou uma colaboração com Djonga, a faixa “Gueto Feroz”. Este é o primeiro single do novo disco do artista, que traz uma sonoridade cinematográfica e potente, transitando entre o funk e o rap. A letra trata sobre a valorização das vivências periféricas, com frases diretas e sensíveis, como a que diz “rap é arma e sei usar a arma que tenho”.
O lançamento veio acompanhado de um belo lyric video:
Este foi o início de um novo capítulo: Ramonzin, que comemora 20 anos de carreira em 2020, lança em breve um novo álbum com outras participações ilustres, entre elas Malía, BK, Luedji Luna e L7NNON. O Papelpop conversou com o artista por telefone sobre a estreia e as formas de conectar a arte ao público.
PAPELPOP: O single “Gueto Feroz” tem uma pegada que transita entre o funk e o rap. Esse caminho sonoro que a produção tomou foi intencional, ou essas coisas vão acontecendo?
RAMONZIN: Primeiro é a gente entender quais sãos as linguagens, porque estou tratando de um discurso que é político e social. Ao mesmo tempo, num ritmo que é um funk e um trap, que é periférico. E o lyric vem com uma linguagem bem urbana na estética das imagens, então quando você consegue combinar as imagens, a música e o discurso, só vai somando. Então tem que pensar como vai entregar isso da melhor forma. A dificuldade não existe quando você consegue somar essas linguagens.
Qual foi a intenção de trazer um funk com um discurso político? Você sente que isso faz falta no gênero atualmente?
Sim, total. Sem dúvidas. O funk é muito diferente do que como se iniciou no final dos anos 80 e início dos 90. Então a ideia é entender que o funk de hoje é movido pela indústria com a ideia de entretenimento. Eu acho maravilhoso, curto e adoro também. Entender isso como manifestação espontânea cultural, mas também saber que ele veio de um discurso político, social, econômico pra dizer o que estava dizendo na favela, que ninguém tinha como levar essa mensagem a não ser os MCs pra suas próprias áreas, assim como o rap também. Foi só unir um ao outro e dizer “o rap e o funk hoje estão assim, mas já foram assim também”. É importante só pra abrir um espaço pra reflexão.
Perceber e lembrar de como o que fazemos hoje talvez já teve muito significados é muito importante, né? Suas letras são muito diretas. Você sente que quando as escreve fala mais sobre essas lembranças de si ou dos outros, pela observação?
Acho que estou nesse bolo, né? Quando falo sobre uma questão social, é de algo que todo mundo participa, principalmente política. Eu não estou muito longe do discurso que falo pro outro, porque acho que minha maior matéria prima pra fazer as coisas, independente de qualquer panorama do mundo, são as pessoas. Me preocupo com o discurso daquilo que estou projetando pras pessoas. Então é óbvio que estou sempre pensando nelas. O que elas estão vivendo, o que estou vendo na rua. Sejam essas coisas boas, ruins, divertidas ou não… é sempre um foco imaginário de uma lente cinematográfica. É a forma que imagino. De certa forma, imagino também, porque estou ali perto, vendo e sabendo, no mínimo. Então estou participando também.
E como foi colaborar com outro cara que também é muito honesto e direto nas letras, que é o Djonga? Vocês já se conheciam?
Eu conheço de uma forma profissional, porque eu não sou amigo vizinho dele, né? Trombei com ele algumas vezes em alguns shows que a gente fez. Ele já conhecia meu trabalho e quando comecei a formatar meu disco novo, entendi que ele tinha uma ligação direta com o tema do trabalho. Fiz o convite e não teve dificuldade em aceitar. Disse “vai ficar foda e vamos nessa”. Mandei a música e ele demorou um pouquinho, por essa correria de show e tudo mais, mas quando voltou a música, ficou foda. Aí consegui fechar ela. Ia fazer um clipe, mas aconteceu a pandemia e não tem como ninguém ir pra rua. Mas o lyric ficou incrível.
E como é criar essa associação entre a música e os visuais pro lyric video?
Eu já tinha ideias do que eu queria pro clipe. Eu sempre tento participar dos roteiros, conceito e simbologia da coisa. E trouxe isso pro lyric. A equipe entendeu essa linguagem e foi somando comigo pro roteiro. Essa simbologia, do que tratavam as coisas. A gente não teve muita dificuldade, porque teve um feeling muito igual. Fomos construindo rapidamente e chegamos ao resultado que a gente queria.
A letra tem um trecho que diz que você sabe usar a arma que tem no rap. Como foi aprender a usar seu talento a favor de sua mensagem?
Na verdade, trabalho com isso há muitos anos, então entendo o poder de projeção que as palavras têm. Hoje as coisas se difundiram muito por conta da internet e as pessoas não percebem que as palavras delas têm muito efeito, né? E com essa era meio individualista, é a cultura de um indivíduo só, um universo muito plural. O que quero tentar passar é que cada indivíduo tem uma força muito grande quando sabe canalizar o que quer falar e pra quem quer falar. A ideia de coletivo se perde porque as pessoas só pensam a partir do indivíduo, de uma forma negativa. As pessoas têm que entender o valor da palavra, seja pra quem tem o conhecimento ou pra quem não tem, pra falar também. E vem muito da ideia de empatia, de se colocar no lugar. Acho que quando a gente conseguir ajustar esse equilíbrio, vamos ter uma convivência melhor no comportamento e convivência.
Desde 1999, nesses anos de carreira, você sente que as urgências mudaram?
Óbvio, mudou muita coisa. E é difícil. A linguagem é o que movimenta e é ela que programa as ações que vão pra frente. Como trabalho com isso há muito tempo, o discurso começa a não atingir as camadas que precisam ser atingidas. Pra quem vem de antes, é difícil estar se atualizando, mas é necessário. É o que se faz. Preciso estar entendendo como as coisas se manifestam e qual o movimento dessa linguagem, pra eu poder conversar com essas marcas, esses nichos e públicos. Sua arte tem sua identidade própria, só que é muita presunção continuar com uma linguagem sua e esperar que as outras gerações entendam. É como falar uma língua e esperar que as pessoas entendam.
Falando sobre seu novo disco, entre os artistas que estarão presentes, estão duas sensacionais, Malía e Luedji Luna. O que podemos esperar dessas faixas?
Quando chamei a Luedji pra fazer uma música, fiz mais pra ela do que pra mim. O trabalho dela é muito marcante. Você consegue entender o estilo dela. Fiz mais um trabalho de compositor do que artista propriamente. É naquele estilo “como eu faria uma música pra Anitta, Iza ou Ludmilla?”, aí você começa a imaginar como essa pessoa canta e dança. Fiquei pensando justamente na expressão da Luedji. E fiz uma música super foda, que é super diferente das demais, que não é propriamente um rap. É bem MPB, bem mesmo. E vai pegar uma galera bem maneira com isso aí. E voltando ao disco, tem participação também do L7NNON, um moleque que surgiua gora e é muito bom, Malía, minha estrelinha, que já começou comigo dentro da gravadora também, e tem faixa também com o BK, um cara do rap que conheço há muito tempo.
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