A tarefa de interpretar canções eternizadas nas vozes de lendas como Gilberto Gil, Caetano Veloso e Rita Lee é árdua. Na maioria esmagadora das vezes, espera-se algo semelhante ou superior ao que foi consagrado em discos canônicos, basilares da MPB.
A questão é que, para honrar obras como tais, não é necessário se apegar a uma linha de pensamento comparativa. Até porque, seria impossível ir além do que foi entregue há 40, 50 anos, quando o Brasil vivia um contexto de intensas mudanças e uma explosão de criatividade que mudariam para sempre os rumos de nossa música.
Illy, ao tomar a decisão de homenagear a ídola Elis Regina, que é parte da trilha sonora de sua vida, decidiu colocar o desapego como uma prioridade. Assim como diz a letra de “Atrás da Porta”, clássico do disco “Essa Mulher” (1979), a cantora quis revirar do avesso a o universo da “pimentinha”.
Gravado majoritariamente no segundo semestre de 2019, seu novo leque de canções abandona as notas altíssimas empregadas pela musa em faixas como “Alô Alô Marciano” e “Fascinação” a fim de conduzir esse repertório rumo a um lugar mais calmo e suave, embora não menos denso e emocionante. Com arranjos modernos e flertando com o pop, acima de qualquer outro gênero, ela entrega um registro carregado de ternura e afeto.
Há frases que marcam e uma delas é “O novo sempre vem“. Faz sentido, visto que aqui os arranjos tradicionais dão lugar a novas composições sonoras, mais agitadas, embaladas pelo samba-reggae, o funk melody e ou mesmo pelo rock – todos com a cara do Brasil. Vale a pena fazer uma audição mais atenta a “Na Baixa do Sapateiro”, aquela que talvez seja a faixa mais poderosa do disco. A versão de “O Trem Azul”, lançada originalmente em 1982, é outra que caminha elegância e fala diretamente à alma de quem ouve.
A fim de ajudá-la na missão de resgatar histórias de amor, repulsa política e deslumbramento, foram convidados dois artistas: os amigos Silva e Baco Exu do Blues, que cantam nas faixas “Atrás da Porta” e “Me Deixas Louca”, respectivamente.
“Te Adorando Pelo Avesso”, que faz referência à deusa Elis até mesmo em sua capa, uma releitura do disco “Elis” (1973), é uma injeção de frescor única. Esse elemento, já característico do trabalho de Illy, só deixa as canções de Elis ainda mais atuais.
Foto: Julia Pavim
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