Chico Felitti se mudou pra São Paulo capital no fim da adolescência e, como muitos de nós, trombou certo dia com a figura de Ricardo Correa da Silva, conhecido pelo indigno apelido de “Fofão da Augusta”. Os encontros pelas ruas movimentadas da metrópole foram vários, mas Ricardo só cederia aos seus insistentes pedidos de entrevista já no fim da vida.
Fascinante, na mesma proporção em que também se mostra comovente, sua história ganhou milhões de acessos por meio de um perfil publicado no site Buzzfeed. Os eventos que marcaram a trajetória daquele homem, entretanto, ainda estavam incompletos. Foi aí que o autor precisou esquadrinhar ainda mais o passado, descobrindo a presença de um grande amor. Seu trabalho deu origem ao excelente “Ricardo & Vânia, livro elogiado por cada um de seus muitos leitores – inclusive os que estão na nossa redação.
O fato é que Chico, vencedor de entre outros prêmios o Comunique-se e o Petrobrás, é dono de um dos pares de olhos mais sensíveis do jornalismo brasileiro. Há dois novos projetos de sua autoria na pista: além da biografia “Mulher Maravilha”, que desvenda o passado mágico de Elke Maravilha, ele também estreia no próximo mês de abril o livro “A Casa”, em que narra os 40 anos da seita de João de Deus, médium acusado por mais de 500 mulheres por abuso e assédio sexual.
É hora de se cuidar e a leitura assume um papel importantíssimo neste momento. Por isso mesmo o Papelpop quis saber quais livros ele indicaria para ler em casa durante o período de isolamento social. Entre suas escolhas (foram 13 no total!) estão obras de autores como Drauzio Varella, Ottessa Moshfegh e Liudmila Petruchévskaia. Temos livros dele também? Temos!
Essa lista diversa e igualmente maravilhosa, com comentários feitos pelo próprio Chico, você espia a seguir.
Quer mais um motivo para amar Doutor Drauzio? Então toma: “Estação Carandiru”. Eu li esse livro quando era moleque, e lembro de ter ficado assombrado com as histórias narradas por um médico, que trabalhava como voluntário nesse presídio.
Vinte anos antes da polêmica de ter abraçado uma detenta transexual que não recebia visitas há oito anos, Doutor Drauzio já era médico voluntário no sistema prisional. E um médico que conhecia as histórias dos seus pacientes. A história de um dos maiores presídios do mundo.
Estação Carandiru narra o que poderia ser óbvio, mas não é: por trás das grades, estão pessoas. Pessoas com nomes, como Margô Suely, uma travesti baixinha que conquistou respeito numa cadeia de 7.000 homens cis, e Neguinho, que não conheceu pai nem mãe até ser preso e se encontrar com seu pai no Carandiru.
O livro traça um mapa detalhado de como funciona um presídio no Brasil. E termina com a invasão da Polícia Militar que terminaria na chacina de 111 presos (segundo os dados oficiais, as vozes do Carandiru afirmam que foram mais de 250), e o fechamento da cadeia. Ainda bem que alguém contou a história, enquanto era a tempo.
Outro incentivo, além de ser um livro grande e fácil de ler, é um livro barato: a versão virtual custa menos de R$ 7, e o exemplar físico sai por R$ 10.
A arte imita a vida. Só que na quarentena, parece que é a vida que tá imitando esses dois livros.
“Meu Ano de Descanso e Relaxamento” foi um livro que caiu que nem uma bomba nos EUA faz dois anos. A autora, Ottessa Moshfegh, criou uma personagem sem nome que decide não sair de casa por um ano. Ela detestou a faculdade e tinha um trampo meio merda como a maioria de nós.Mas ela tinha algo que nós não temos: um apartamento gigantesco em Nova York e uma herança que permitia colocar todos os boletos no débito automático. Então ela decide dormir por um ano.
Com ajuda de uma psiquiatra que parece precisar de uma psiquiatra (a maravilhosa dra. Tuttle), ela se entope de remédios. E dorme. O livro acontece nos momentos em que a faixa-preta da tarja preta não está dormindo, e as coisas acontecem –nunca como o esperado. É engraçado, é sombrio, é um livro muito de hoje.
Um outro que também é sombrio, mas pisa longe do engraçado, é “Quarto”. Nesse livro, de Emma Donoghue, a quarentena é involuntária, e longuíssima: uma jovem é sequestrada na rua e colocada dentro de um bunker pelo sequestrador, e obrigada a viver lá, sem contato com o mundo e atormentada por uma violência diária como o pôr do sol.
E, dessa violência, nasce um menino chamado Jack. Jack não sabe que seu pai é uma pessoa horrível. Ou que sua mãe não queria estar no quarto onde eles moram. Ele nunca viu o mundo lá fora. Seu universo se limita aos cinco passos que ele consegue dar dentro do cômodo. Seus amigos são o Tapete, a Mesa, a Cama, tudo com letra maiúscula, porque são os únicos personagens da sua vida.
Em 2015, O Quarto de Jack virou um filme que fez algum sucesso –a Brie Larson até ganhou até um Oscar pelo papel de mãe–, mas é um daqueles casos em que o livro supera (e muito) a adaptação. Recomendadíssimo –pra quem não tem gatilho de claustrofobia, é claro. É um livro lindíssimo, mas de uma tristeza que não dá pé.
Imagine acordar um dia de sonhos intranquilos e se ver transformado em um… macho. É o exercício que a Claudia Tajes coloca o leitor pra fazer no hilário “Macha”. Celina é sua protagonista, uma bancária gaúcha, que um belo dia acorda de sonhos intranquilos com uma barriga peluda, uma bunda chupada pra dentro e um pinto mole –mole, grande e que ela não sabe operar.
Essa mulher vai ter de se locomover nessa carcaça, criar seu filho nessa carcaça, trabalhar nessa carcaça. Mas é claro que não dá certo. Macha briga com a amiga bolsonarista, é explorada por um banco e entra em discussões sobre borda recheada de pizza (spoiler: ela, como toda pessoa sensata, acha um lixo).
O livro é ágil, rápido e cruel. Mas cruel com o lado certo: a piada aqui é o opressor. O macho médio e medíocre que nasce ouvindo que merece estar no poder. E que às vezes chega ao poder de fato, olhemos ao redor. Mas macho medíocre nenhum tem o poder da Claudia Tajes, de fazer rir enquanto bota os dedos em feridas profundas.
“Eu dei à luz a uma criança, um filho, mas tenho milhares de filhas. Vocês são negras e brancas, judias e muçulmanas, asiáticas, falantes de espanhol, nativas da América e das ilhas Aleutas. Vocês são gordas e magras, lindas e feias, gays e héteros, cultas e iletradas. E eu estou falando com todas vocês.”
É impossível escrever sobre Maya Angelou algo que ela mesma já não tenha escrito mais bonito. Por isso eu separei uns trechinhos desse livro, uma carta que Angelou escreveu não para uma filha, como engana o nome, mas para todas as mulheres do mundo.
“Você não pode controlar todos os fatos que acontecem em sua vida, mas pode decidir não ser diminuída por eles. Tente ser um arco-íris na nuvem de alguém.”
O livro é uma série de cartas curtas, costuradas por tema. Ou, como definiria a autora: “Você encontrará neste livro relatos sobre amadurecimento, emergências, uns poucos poemas, algumas histórias leves para fazê-la rir e algumas para fazê-la meditar”.
Angelou poderia ser cancelada por algumas frases desse livro, como quando fala que piercings são vulgaridade, mas seria uma baita injustiça levantar uma palavra que seja contra uma mulher negra que nasceu em 1928 e mudou a cultura do mundo.
Duvida? Ouça um pedaço da introdução lido pela própria dra. Maya Angelou e me responda.
Malu e Natália são duas primas que crescem juntas no Realengo, um bairro pobre e enorme na Zona Oeste do Rio. As duas meninas compartilham família, amigos, colégio, sonhos. Parece que o romance vai seguir o amadurecimento das duas, numa escola Elena Ferrante de escrita. As duas vão crescendo, com algumas felicidades e muitos problemas –como um episódio de abuso sexual.
Até que a realidade rompe. Malu está na sala de aula uma manhã quando entra um adulto. Ele diz que é ex-aluno do colégio público, e que veio dar uma palestra.
A protagonista conta: “Lembro vagamente de ele ter mencionado algo sobre uma palestra quando entrou na sala. Tirou dois revólveres da bolsa e apontou para as meninas sentadas na primeira fileira. Que legal, pensei. Achei que era uma demonstração de segurança.” Os capítulos que se seguem são inesquecíveis.
Daniela Kopsch tece uma história ficcional lindíssima ao redor de um fato real: a tragédia de Realengo. Foram 13 mortos, inclusive o próprio atirador, mas alguma coisa a mais morreu naquela manhã de 7 de abril de 2011. Morreu no país inteiro. É um momento divisor, como essa pandemia deve ser um momento divisor de 2020 para frente.
É um livro terno e sombrio, mas com alguma coisa de esperança. De que, no final, a vida vence. Por mais pessoas que existam tentando fazê-la perder. O ebook de “O Pior Dia de Todos” está de graça na Amazon, no Google Play e na Apple Books, até dia 31 de março.
Tá. É um momento de mobilização mundial, e ninguém quer ler um livro fútil ou engraçado. Ou é um momento de mobilização e drama mundial, e justamente por isso a gente mereça ler um livro engraçado e fútil
Arthur Less é um escritor fútil, mas que só é engraçado quando visto por fora, por se levar muito a sério. O gringo está chegando aos 50 anos quando recebe um convite de casamento: seu ex-namorado vai se casar.
A alegria do outro só faz eco de todos os fiascos que ele teve na vida. Less então decide dizer sim para todos os convites que um escritor mais ou menos famoso dos EUA recebe. Muita furada. Ele sai viajando o mundo num Comer, Rezar e Amar em que todas as viagens dão errado.
É um livro hilário sobre a vaidade do mundo gay. Num momento em que vaidade faz menos sentido do que nunca, fica ainda mais engraçado.
Já faz alguns anos que, todo ano quando vão anunciar os vencedores prêmio Nobel, algum entendido aposta no nome de Liudmila Petruchévskaia.
Liudmila (o nome se fala é igual ao da Ludmilla, que tá vendendo a grama da verdinha a um real) é uma escritora russa loira, de nariz marcante e 80 e poucos anos. Ela só veste preto, e muitas vezes usa chapéu e boá de pena. É importante falar da aparência dela porque ela se parece com um personagem dos seus livros
Era Uma Vez Uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha é um livro de contos. Contos de fada meio sombrios, como o que dá nome ao livro, de duas melhores amigas cuja amizade azeda porque uma delas dá à luz a uma menina linda. Talvez a menina mais linda que já existiu.
Se você é chegado no terror ou gostaria de ver uma versão sombria dos contos que a Disney enche de açúcar, esse livro é para você. Pessoas somem, levadas pela polícia, bebês surgem de repolhos (e não de um jeito fofo) e uma família decide de refugiar do mundo, tipo uma árvore genealógica de Robsons Crusoés.
Ah, e se você acha que esses dias estranhos dariam um bom roteiro sombrio, o livro tem um conto, Higiene, que é sobre uma epidemia.
Se você ler e ficar obcecado pela Liudmila (eu fiquei), é bom saber: ela anda vindo bastante para o Brasil, onde um filho dela passa uns meses do ano, e de vez em quando ela canta em alguns teatros –sim, porque, assim como um personagem que ela escreveria, Petruchévskaia não só é uma das melhores escritoras do mundo; ela também é cantora.
Maria Carmem, a protagonista desse romançaço de 157 páginas, é uma guria da sexta série A que escreve cartas para o Homem Aranha e ajuda os pais no negócio meio falido da família, uma loja de artigos ortopédicos, cujos únicos clientes têm idade para ser seus avós.
A menina é inteligente demais para sua idade. Grande demais para sua idade. Gorda demais para sua idade. E sonha com uma vida amorosa que não chega, enquanto seus pais, ainda jovens e charmosos, exercitam sua vida amorosa: seu pai e sua mãe arranjam um namorado. Acompanhamos a descoberta de um mundo complicado, que tem trelelês e ciúmes, na cabeça dessa menina inteligente e desajustada.
Ela é desengonçada, não conhece muito a geografia da sua carne e por isso tenta dominar seu corpo, para nunca mais cagar –ela não gosta de cagar na frente do desconhecido que passa a frequentar sua casa.
Maria Carmem sou eu, Maria Carmem é você e com certeza Maria Carmem é um tanto da autora desse livro engraçado, Mariana Salomão Carrara.
A Bruna Beber é poeta jovem, mas velha na experiência. Ela já lançou quatro livros antes de Ladainha, que é uma coleção de poemas sobre temas banais e esquisitos, que tocam lugares curvas do cérebro que a gente nunca acessou.
Fui reler e tudo me pareceu escrito para uma quarentena que não existia quando o livro foi publicado. Especialmente a parte 3 do poema Vidádiva:
“Não deu meio-dia
E cabe mais medo na cabeça
Que panela em cima da mesa
E esse barulho
É chuveiro quente ou fritura?
São nem quatro da tarde
Mas já dói o poente
O modo, a morte e o mérito
Esse barulho
É ventilador de teto ou pião?
Não é meia-noite
Andei a vida inteira
Melhor é caminhar
Esse barulho
É chuva ou salva de palmas?”
Um livro lindo, para lembrar que a beleza vai sempre existir, apesar de tudo.
Você tá penando com o seu Trabalho de Conclusão de Curso e acha que ele não vai servir pra nada? A Camila Cetrone é um exemplo de que, mesmo na faculdade, você já pode fazer um trabalho de profissional.
“Manda as Bicha Descer!” é um retrato bem pintado da Casa 1, centro de acolhida para pessoas LGBTQ+ no centro de São Paulo. Camila ficou seis meses trabalhando como voluntária na Casa 1 para escrever esse livro, quando ainda estava na faculdade, e o resultado é um mapa de uma juventude que tem uma grande parte do mundo contra ela.
É um livro justo, transparente. Não apela para pieguices ou sentimentalismos, e evita a arapuca de “coitadizar” pessoas em um momento de fragilidade. E, por serem muito reais, as histórias são riquíssimas. Tem Diana, que responde a um pedido de entrevista com: “Pesquisa meu cu”. E Denise, a guardiã dos livros, que cataloga a biblioteca com afinco até que alguém rouba o laptop do lugar –mas esquece de levar o carregador. E de Rosa, que está prestes a se internar voluntariamente por seis meses, em uma clínica de reabilitação.
Um livro sobre o hoje, para se ler ontem. Está à venda na Amazon.
A biografia que de que eu falei no Wanda de carnaval, umas semanas atrás, está de graça pelos próximos 30 dias, para a alegria quem está de quarentena. Mulher Maravilha é um audiolivro, dividido em 11 capítulos de até meia hora cada um. Conta como Elke, que ficou famosa por aparecer na TV aberta foi um personagem de si mesma.
Ela mentiu durante toda a vida que era russa. Dizia que tinha nascido em Leningrado, mas na verdade foi registrada em uma cidade do sul da Alemanha no fim da Segunda Guerra, logo antes de vir pro Brasil. Mas o grosso da história inacreditável de Elke era verdade.
Ela peitou Silvio Santos, foi presa durante a Ditadura Militar por rasgar cartazes com o rosto de um perseguido político, no aeroporto, e foi uma das modelos mais famosas que o Brasil já teve. Falava oito línguas, teve oito maridos, três nacionalidades, fumou um milhão de cigarros, bebeu 10 mil litros de cachaça e fez três abortos, dos quais falava abertamente.
Elke era uma mulher à frente do seu tempo –e estaria à frente de hoje, também, se ainda morasse nesse mundo.A Storytel está dando acesso a todos seus livros e podcasts por um mês, de graça, para quem está de quarentena, nesse link aqui.
O outro peixe próprio que venho vender é o livro A Casa, com a história dos 40 anos da seita que João de Deus fundou no interior de Goiás.
O livro conta desde o começo como João Teixeira de Faria foi de um alfaiate analfabeto a um dos maiores líderes místicos do mundo. Traz casos inéditos até agora, como o de uma escritora famosa que chegou a pagar US$ 50 mil para uma mulher que afirmava ter sido abusada por João nos EUA não seguir adiante com um processo.
E revela os personagens que foram decisivos para João de Deus ficar famoso no mundo todo e enganar até a Oprah, como a ex-atriz pornô britânica que virou seu braço direito na Casa. A história do lugar passa pelas vezes em que a Polícia Federal descobriu material radioativo escondido dentro da Casa, esperando para ser contrabandeado.
Se você gostou de Wild Wild Country, acho capaz que se interesse. A Casa está em pré-venda no site da Editora Todavia. Quem comprar até dia 6 de abril ganha 20% de desconto e um exemplar autografado, que vai ser enviado no dia 6, se o correio estiver funcionando até lá.
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