A música pop e suas ramificações não está restrita apenas à sofrência amorosa, ao chamego, às festas e à curtição. Muitas de suas crias também trazem pautas importantes como a violência policial e o racismo, a intolerância política, o poder popular, a LGBTfobia e vários outros temas de interesse social.
Neste ano conturbado foram vários os exemplos de artistas que botaram seu time em campo e lançaram músicas capazes de fazer refletir profundamente – embora muitas delas nos fizeram dançar até o chão. Dançando com a mão na consciência, seria melhor dizer? Hahahaha Bora relembrar quem fez isso?
“God Control” é uma faixa política e seu clipe também. O vídeo-manifesto tem pouco mais de 8 minutos e mostra um retrato aterrorizante do que as armas de fogo podem provocar na sociedade. A violência embalada com o terror dos tiroteios em massa fica evidente no clipe.
Há claras referências à boate Studio 54 e ao massacre da boate Pulse, em Orlando, que ocorreu em 2016. O atentado matou cerca de 50 pessoas e deixou outras 53 gravemente feridas. O espaço era conhecido por ser um lugar LGBTQ+.
Não há dúvidas da importância de uma música dessa numa época que é bastante discutido o Gun Control (controle de armas) em governos de extrema direita, né?
Uma das músicas brasileiras mais comentadas do ano e, também, mais importantes. Emicida uniu Majur e Pabllo Vittar num sample tão improvável quanto admirável de “Sujeito de Sorte”, de Belchior (1976).
Além da releitura do clássico, os três artistas cantam um trecho do poema “Permita Que Eu Fale”, do próprio Emicida. A música é um manifesto sobre suas lutas diárias e resiliência, principalmente sendo negros e/ou LGBTs.
É um manifesto de esperança àqueles que lutam para um mundo mais justo e menos opressivo. São palavras conforto, tipo um amigo te dizendo: “Oi, você não está sozinho. Estamos juntos nessa. Vai ficar tudo bem”.
É aquilo: Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro…
“Magenta Cash” é simplesmente sensacional! Gloria faz críticas ao “pink money”, termo usado para caracterizar a comercialização de produtos LGBTQ+.
Esse parecer vem porque muitas pessoas acabam vendendo temas LGBT friendly apenas para lucrar em cima desse grupo de pessoas, quando na real não se importam. Com a representatividade em alta, eles querem mais é o nosso dinheiro, o “magenta cash”.
O clipe, além de ser todo pautado em tons de rosa, é dirigido por Felipe Sassi (criador de um universo cinematográfico incrível). Vem se jogar nessa música super animada e dançante com a gente!
“Queima” tem batida e significado fortíssimos! A nova música de Cleo, que marca sua primeira parceria com Pocah, fala sobre o poder feminino e a caça às bruxas, que acontece até hoje de distintas formas.
A faixa é uma resposta àqueles que tentam silenciar e diminuir o poder das mulheres. Isso fica ainda mais evidente no clipe, que tem participações ilustres de Zélia Duncan, Anielle Franco, Rafa Villella e Indianare Siqueira – mulheres poderosas que simbolizam resistência.
A ideia é representar, além de força feminina, uma quebra dessas opressões. Queimar todas as mazelas sociais e assumir o controle de nossas vidas.
Outra música com letra e clipe importantes! “Mother’s Daughter” faz parte do mais recente EP de Miley Cyrus, “She Is Coming”. A letra tem frases como: “não foda com a minha liberdade (…) saia pra lá garoto”. E o clipe é incrível!
Miley e sua mãe, Tish, aparecem no vídeo ao lado de várias outras mulheres fortes de diferentes etnias e corpos. A artista até havia feito um post em seu Instagram para cada moça que participa do clipe, com textos sobre a vivência de cada uma. No vídeo, vemos crianças, mulheres gordas, cadeirantes, não-binárias e várias mensagens de empoderamento feminino e da luta feminista. Por exemplo: “virgindade é uma construção social” e “toda mulher é uma revolução” são uns dos dizeres que aparecem.
É uma celebração das minorias e do poder que toda mulher tem!
Com participação de Karol Conka e Gloria Groove, “Quem Tem Joga” é um funk que fala sobre empoderamento negro e feminino à partir da estética.
Com referência as batidas do funk 150 BPM, que saíram das favelas cariocas para ganharem o mundo, Drik lançou quase como um canto de liberdade, sobre ser dona do seu próprio corpo e das suas escolhas.
“A mulher preta lida, diariamente, com o racismo e aquele olhar torto para a nossa cor, o nosso cabelo e as nossas roupas. A ideia da canção era falar sobre a falta de respeito que existe com tudo aquilo vai contra ao que é tido como ‘padrão’. As pessoas nos julgam por nossas imagens, que também expressam quem somos e no que acreditamos.”
Outra participação especial em “Quem Tem Joga” é de sua irmã Mirella, de 10 anos, que canta e aparece no videoclipe. Uma fofa! Perguntamos à rapper sobre a relação de sua irmã com as pautas do empoderamento negro, e Drik contou que desde pequena elas conversam sobre isto:
“Na minha geração nos últimos dez anos, não existia essa conversa. Naquela época não tinha rede social, então a gente se enxergava na TV e nas cantoras, e era raro você ter uma referência negra parecida com você. Ainda tem que mudar bastante, mas agora eu consigo apresentar cantoras pra ela que ela vai se identificar com a imagem. Eu converso com ela desde bem pequenininha pra ela se amar e não deixar ninguém abaixar a autoestima dela. Tenho exatamente essa conversa com ela porque eu não tive isso, pra mim demorou muito mais para entender (…).”
A voz angelical de Céu nos lembra das mais aguardadas estações do ano, mas também de tempos sombrios politicamente falando em “Forçar O Verão”.
Verão, aqui, ganha um sentido metafórico. A composição, embora não seja literal, retrata o cenário político do Brasil que se estende desde a queda da presidenta Dilma Rousseff, explicou a cantora. A música é sobre encarar esse momento sombrio cheio de retrocessos.
É, além de tudo, uma reflexão sobre nosso papel na política, nosso papel como cidadãos. Parem de forçar o verão porque não está tudo bem! Estamos pedindo socorro, em estado de alerta.
Quebrada Queer arrasando mais uma vez! Guigo, Harlley, Lucas Boombeat, Murillo Zyess , Tchelo e Apuke Beat surpreendem como sempre com suas letras fortes e cheias de significado. “Pokas” é uma celebração e aceitação de quem eles são. É uma faixa banhada de empoderamento e que diz xô aos haters e homofóbicos.
“É uma música onde a gente fala e mostra, que continuamos aqui, que continuamos em pé”.
“Nem sou obrigado a só revisitar minhas dores / Foi difícil me ver bem né / Agora cês vão me ver melhor / Eu piso no cinismo, mecanismo pra nem sentir dó”, cantam. Outra parte que se destaca na música é a seguinte letra: “Dessa vez você não me tira / Viu a bicha de salto e sei que isso te irrita”, bem afrontosas contra os homofóbicos de plantão. Perfeitos!
“Imensa Luz” fala sobre empoderamento negro, racismo sistemático e também a autoestima da mulher negra. A faixa, que faz parte do “Próspera”, de Tássia Reis, é bem gostosinha de ouvir. “Tô na contramão do sistema / Eu tenho medo da polícia / mas de você, sinto apenas pena / me difamando na rua, mas desse jeito é você quem se queima / Geral já sabe meu valor enquanto isso você ainda teima.”
Tássia também canta sobre Exu, o orixá da comunicação e ordem, e Oyá, orixá da força climática na natruza, enaltecendo a cultura negra. “Trema, entenda que eu sou suprema e (…) A circunstância me faz ser extrema / Não me subestime / Na real ‘cê arranjou problema”.
“A música fala tanto às pessoas que, como nós, se sentem à vontade na pele que habitam, como também àquelas que se incomodam com quem é livre como a gente”, diz Karol. Conka “Alavancô”, sem dúvidas, é um motor que impulsiona mudanças sociais emergentes. É como se fosse literalmente uma alanca ao progresso.
“Pode parecer loucura / que a minha pele escura na suposta ditadura / criando seus terremotos / expondo suas rachaduras”, canta Linn entre os versos de Karol e Gloria. A faixa é pra aquelas pessoas que não entendem o processo de libertação que as minorias vivem hoje e estão estacadas no passado. Bora, revolução!
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