Castello Branco tem trilhado até aqui um caminho manso, observador. O cantor paulista lançou no último dia 20 de setembro o disco “Sermão”, trabalho marcado por melodias mínimas e vibrações intensas que completa uma trilogia de discos (e “S”). Em 2013, chegou às plataformas “Serviço”; na sequência veio “Sintoma”, em 2017. Agora, nada mais justo do que encerrar este giro.
Após ter passado um tempo em Portugal – onde revelou a este repórter que lhes escreve ter vivido a gênesis de seu novo trabalho -, Castello retornou ao Brasil e se permitiu conhecer suas próprias intenções. Quis se desafiar, a partir deste projeto, que chega com patrocínio do edital Natura Musical, coisas que sentia intrinsecamente. Seu desejo era mostrar que podia ir ainda mais longe.
Por telefone, nós batemos um papo com ele antes do show de estreia do álbum, que rola neste sábado (9) na Casa Natura Musical, em São Paulo. Ao Papelpop ele falou sobre o caos que se instaura no Brasil, sua evolução artística e ainda esmiuçou a nova fase que vive. Leia:
“Sermão” é um trabalho que completa a terceira parte de uma trilogia iniciada em 2013. Qual o balanço você faz do encerramento deste ciclo?
Eu acho que eu fiquei feliz porque fez sentido o momento de cada um, fez sentido o que fomos estudando, em termos de tempo. Eu tive certeza que seria uma trilogia, já sabia o que queria. Mas como é uma história que todo mundo tava vivendo, precisava esperar o tempo rolar. Não era como um livro, era algo que tava sendo contado na hora, no devido momento.
E você está feliz com o resultado, como tem percebido a recepção das pessoas?
Eu acho que dos 3 discos que lancei, este é o mais provocativo. A começar pelo nome, que é muito forte e provocativo. Tem muito significado, muitas pessoas acham que eu tô dando sermão, mas na verdade as pessoas perderam a subjetividade, querem tudo direto, mastigado… estão acostumadas, eu acho. Quando eu assino e batizo um disco de “Sermão”, isso soa meio óbvio pra alguns. Porém, se a gente observa o contexto, a capa, tudo com cuidado, vemos que não sou eu que tô dando bronca. Demora um tempinho pra gente entender.
Como foi a construção do conceito do disco e a produção? Há quanto tempo você vem trabalhando nessas questões?
Tudo começou no passado, quando eu fiz uma turnê em Portugal. Esse disco vem a partir de episódios que vivi lá. Trata-se de um país muito católico, logo esta palavra escolhida para o título é também uma palavra bíblica. Aí temos essa coisa desafiadora de compor músicas, o que diante de tais vivências é muito inspirador.
Uma coisa que me chamou muito a atenção foi a capa, em que você aparece diante de uma sala de aula. Como surgiu a ideia para a criação desta imagem?
Sim, tenho um cuidado muito grande! A capa é igualmente uma provocação, pra pensarmos ainda o que a gente tá fazendo da educação, o que a gente espera em termos de mundo…
O trabalho sonoro feito em “Sermão” tá bem bonito e fiquei curioso quanto às suas referências. Durante a produção do disco, alguém ou algum som te influenciou?
Eu acho que eu sempre fui muito de ouvir tudo. Este disco é bem diferente, tem algo que nos une, mas elas são um pouco mais diferentes uma das outras. Eu me segurei muito na questão da adoração, dos coros, eu queria trazer isso pro disco, a energia de adoração, de adorar o som, de viver uma forma forte e bonita. Elas todas são voltadas pro serviço. Servindo aquilo ali, a energia pra chegar num lugar.
Seu último disco, “Sintoma” foi bastante elogiado… o que você incorporou no seu som de lá pra cá e podemos ver neste novo trabalho?
Essa trilogia passeia no tempo. Serviço tem simplicidade e potencia, foi o meu passado. O monastério, o contexto que fui criado com as minhas irmãs. É um sentimento a respeito do futuro, o que viria acontecer. É uma coisa interno, cinza, delicado, todo fechado. Já Sermão, representa o presente, é forte, o tempo mais poderoso. Por isso é mais pra fora, fala alto, representa.
Pra fechar… Nas composições você fala muito sobre encontros, diálogo, trocas. Trazendo para o contexto atual do Brasil, que vive um cenário caótico, você acha que isso pode ser uma saída?
Sim, acho que sim, e eu creio que temos muitas saídas. Aliás, apresento uma: estamos num momento de necessidade. É mais importante a saída do que a entrada, tá todo mundo muito perdido… Fui tocar no Nordeste, às margens do oceano, em um lugar voltado pro contemplativo, e notei que as pessoas estão tendo dimensão do que tá acontecendo. Todos buscando saídas e acho que a arte é a tradução do que vive, a arte tá sempre traduzir o nosso tempo. Ela busca isso e é uma frequência que eu tento me encaixar, que penso ser importante. A parte legal é que as pessoas estão com mais responsabilidade sobre o que ouvem e em como se relacionam. É um processo hipnótico, a musica. No geral e comumente, ninguém quer ter responsabilidade. Há coisas que precisam ser ditas, mais do que serem repetidas na internet.
“Sermão” está disponível em todas as plataformas digitais. Ouça:
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